sábado, 11 de agosto de 2007

DISCURSO DO PRIMEIRO-MINISTRO NA TOMADA DE POSSE DO IV GOVERNO CONSTITUCIONAL - 8 de Agosto de 2007

DISCURSO DO PRIMEIRO-MINISTRO NA TOMADA DE POSSE DO IV GOVERNO CONSTITUCIONAL
( 8 de Agosto de 2007 )

Sua Excelência, Senhor Presidente da República
Sua Excelência, Senhor Presidente do Parlamento Nacional
Sua Excelência, Senhor Presidente do Tribunal de Recurso
Sua Excelência, o Representante Especial do Secretário-Geral da ONU
Suas Excelências Reverendíssimas, os Bispos da Diocese de Díli e Baucau
Senhores Membros do Parlamento e do Governo
Senhor Brigadeiro-General, Comandante das F-FDTL
Senhor Comandante-Geral Interino, da PNTL
Suas Excelências, Membros do Corpo Diplomático e Consular,
Representantes das Agências Internacionais
Senhores Membros da Sociedade Civil e da Imprensa
Senhoras e Senhores

O dia de hoje é mais um marco importante para a jovem democracia timorense, porque culmina um longo processo que se iniciou no princípio deste ano com as eleições presidenciais, logo seguidas das legislativas. Estas últimas especialmente, tendo em conta os seus resultados, foram um verdadeiro teste à Constituição da República Democrática de Timor-Leste e à maturidade democrática dos timorenses.

Essa maturidade esteve presente naqueles que apresentaram e defenderam as suas candidaturas, naqueles que empenhadamente tornaram possível o processo eleitoral, naqueles que acorreram às urnas para endossar a sua confiança política através do seu voto, naqueles que ao longo deste mês participaram e contribuíram para um diálogo verdadeiramente democrático na procura da melhor solução de estabilidade para o país – todos fomos neste processo, agentes activos da democracia.

Os resultados da eleição do passado dia 30 de Junho são absolutamente inequívocos, abrindo um novo ciclo na vida política do país. Os timorenses elegeram os seus representantes ao Parlamento Nacional, consagrando uma maioria parlamentar, maioria esta que recebe um mandato claro para formar um Governo estável.

Este mandato revela a vontade política de mudança dos timorenses, um sinal de confiança, mas também de exigência e por isso dedico-o a todos os timorenses, desde Lospalos a Oé-Cusse. Foi, por todos os timorenses e para os timorenses, que recebo o desafio de chefiar o IV Governo Constitucional, que Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, aceitou nomear com a legitimidade democrática e constitucional de que está investido.

Represento, hoje, como Primeiro-Ministro empossado, a conjugação dos esforços de quatro partidos, unidos numa Aliança para uma Maioria Parlamentar, que encaram a redefinição do caminho que o país irá percorrer, como uma oportunidade única para transformar Timor-Leste numa comunidade nacional estável, solidária, unida e voltada para o futuro.

É, portanto, a vontade dos timorenses, a vontade de mudança, a vontade de um novo projecto político reformador, que hoje toma posse.

Agradecemos a confiança depositada em nós e estamos convictos de que não iremos defraudar as expectativas de todos, porque o que nos uniu para formar este Governo foi tão-somente o superior interesse deste povo. Foi esta a razão porque vários partidos se uniram e entrosaram um conjunto diverso de ideias e projectos para cumprir a nobre missão de garantir ao país e, sobretudo, às futuras gerações a esperança de um futuro onde o respeito pelos outros e a tolerância andem a par com o desenvolvimento social e económico do país.

Senhoras e Senhores

Olhando para o nosso passado histórico, concluímos facilmente que todos os timorenses carregam um pesado fardo de dor e sofrimento. Após centenas de anos do colonialismo português e de 24 anos de ocupação indonésia, conseguimos, por fim e com muito sacrifício, libertar a nossa Pátria!

O povo tem vindo a provar que a política de intimidações e de violência não o desencoraja, no momento crucial de dar o sim ou o não, ao seu próprio futuro. Fê-lo em Agosto de 1999, fê-lo em Agosto de 2001 e fê-lo, sem hesitação, em Junho de 2007. O povo soube sempre ultrapassar as dificuldades para afirmar o seu desejo. E, em eleições, a esperança é de que o seu voto seja percebido como um voto para melhorar as condições, políticas e socioeconómicas, que rodeiam a sua vida no dia-a-dia.

O desejo maior do nosso Povo é viver em sossego, livre de perseguições políticas, livre de insegurança quanto à sua vida, livre da ameaça ou violação dos direitos humanos! O Povo de Timor-Leste quer viver em paz, sem tiros, sem guerra, seja entre timorenses seja com qualquer outro povo.

A construção do Estado é difícil e todos percebemos isso, desde há 5 anos. A construção do Estado passa necessariamente pelo respeito pela Constituição e pelos valores universais a que também aderimos.

Sem a base nos princípios democráticos, plasmados na nossa Constituição, a construção do Estado será sempre frágil. Os mais sagrados interesses nacionais são os consagrados na Constituição da República.

No ano passado, fomos todos intervenientes e espectadores da história de violência, que continua como um pesadelo pelo nosso passado longínquo e recente. Assistimos decepcionados ao reabrir de feridas que afinal não tinham sido cicatrizadas e ao desabrochar de novas mais profundas. Viveu-se um clima político difícil, onde a tolerância deu lugar à corrosão social, a harmonia rendeu-se à violência, onde a paz de espírito cedeu às tentativas de corrupção de mentalidades, onde a dignidade humana ficou sujeita a manipulações políticas, intimidações e ameaças.

É imperativo reflectir sobre estes acontecimentos, apurar responsabilidades e resolver os estigmas da crise, por isso, parece-me óbvio prosseguir com as recomendações do Relatório da Comissão Especial Independente de Inquérito, para que o povo entenda o que aconteceu e para que deixem de pairar desconfianças entre os timorenses.

Também o relatório exaustivo da CAVR sobre a nossa experiência colectiva ao longo de 25 anos, tem de ser bem digerido. Essa experiência comum ajuda-nos a perceber donde viemos, a conhecer o que somos, e por isso não podemos ignorar os ensinamentos do passado para compreender as crises na actualidade e sobretudo, precaver as futuras.

Compreendido o nosso passado histórico comum, o que o Governo da AMP vos propõe hoje, é libertarmo-nos das amarras do passado, dignificando os nossos heróis da libertação, e alicerçados na força da nossa cultura e do sentimento de pertença a uma comunidade, construir para todos nós um Timor-Leste melhor.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

O processo democrático de Timor-Leste está no seu estádio de crescimento e é, portanto, ainda muito frágil.

Recebemos da UNTAET, em Maio de 2002, um esboço daquilo que seria um Estado moderno, democrático e funcional. Coube ao Dr. Mari Alkatiri e ao seu governo a notável missão de construir a partir do zero as bases de um sistema democrático, edificar as instituições do Estado e desenvolver a Administração Pública.

É inquestionável que desenhar as linhas mestras do desenvolvimento sustentado e do progresso, é uma tarefa árdua para quem herda um País com uma situação económica deficitária, com a maioria das infra-estruturas destruídas e uma Administração Pública inexistente, para não falar de uma série de indicadores característicos de um país subdesenvolvido pós-conflito.

Justamente por isso, quero manifestar o meu reconhecimento pelos esforços desenvolvidos e pelo sucesso conseguido em várias areas fundamentais para o desenvolvimento do país. Muitas das prioridades políticas delineadas pelo Dr. Mari Alkatiri, e reforçadas depois pelos seus sucessores, Dr. Ramos-Horta e Eng. Estanislau da Silva, serão tidas em conta pelo Governo da AMP.

Temos, no entanto, forte desejo de corrigir aquilo em que os nossos antecessores falharam, com a humildade de quem recebe um testemunho precioso mas com a determinação de quem quer a transformação total do sistema, com o objectivo de avançar para uma verdadeira e drástica Reforma da Gestão do Estado.

O compromisso que assumo hoje perante Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, e perante o Povo, é de que nenhuma força política, nenhum sujeito institucional, nenhum representante da sociedade civil, nenhum cidadão, ficará excluído do processo democrático, porque todos serão chamados a participar consciente e activamente na construção do nosso país, salvaguardando os melhores valores da doutrina democrática.

É, portanto, com a participação de todos, envolvendo uma sociedade civil activa e uma oposição responsável que um Governo pode honrar os seus compromissos, respeitando o projecto político que recolheu apoio maioritário dos eleitores - no nosso caso, a fusão de 4 projectos num só. Um programa aberto às propostas de todos, mas orientado pelas suas próprias ideias, pelos seus próprios projectos, pela sua própria agenda.

Deveis ter reparado que a formação deste Governo carece de uma presença mais significativa de mulheres, e isso, não é porque a Mulher timorense tivesse sido menosprezada. Aceitaremos toda a crítica neste sentido, mas o nosso pensamento foi mais orientado para a eficácia da implementação dos nossos programas de Reforma. Este Governo acolhe uma percentagem significativa de profissionais independentes, no intuito de criar as bases sólidas de crescimento. Tendo a AMP um bom número de mulheres no Parlamento Nacional, este Governo vai também projectar uma estratégia mais coerente de formação do potencial feminino nos vários sectores da vida nacional, para que no futuro haja espaço de representação feminina, capaz, nos destinos do País.

Senhoras e Senhores

O Governo que hoje assume funções, tem uma visão e um programa que irá cumprir. O Governo da Aliança para uma Maioria Parlamentar, está estruturado de forma a corresponder a um objectivo concreto de reforma, suportado por um quadro de princípios e de valores sistematizados que orientarão o comportamento político, promovendo:

i) os valores dos direitos cívicos e humanos
ii) os valores da tolerância e de respeito
iii) a solução pacífica dos problemas
iv) os princípios de boa governação, assegurada pela existência de mecanismos fortes e eficazes de combate à corrupção, conluio e nepotismo
v) a participação de todos para responder eficientemente às necessidades básicas da população
vi) o princípio fundamental de que todos devem obediência à lei.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

A acção governamental considerada prioritária e, por isso, a ser implementada até ao final deste ano, passa em primeiro lugar por recuperar a confiança nos órgãos e instituições do Estado.

Para cumprir este objectivo, comprometemo- nos no curto prazo, a:

- consolidar a segurança em Díli e em todo o País, garantindo o regresso aos seus lares, daqueles que se encontram a viver numa situação de character humanitário grave, em campos de acolhimento, proporcionando por isso os meios necessários para que possam refazer as suas vidas;
- solucionar o problema dos peticionários, analisando e implementando as recomendações do Relatório da Comissão dos Notáveis, promovendo o diálogo com as F-FDTL e aplicando medidas de justiça social;
- solucionar, no âmbito dos esforços já desenvolvidos, o problema do Alfredo Reinado e do seu grupo, garantindo desde já que este será um exemplo de que, no nosso país, a justiça poderá tardar mas não falha;
- contribuir para o desenvolvimento comunitário, através dos fundos distribuídos recentemente pelo anterior governo aos chefes do suco, garantindo a sua eficaz aplicação no desenvolvimento das comunidades e criando centros comunitários, sobretudo para ocupar os jovens;
- activar auditorias aos organismos públicos para promover uma gestão de transparência;
- aprovar um Orçamento de Transição, que corresponda às necessidades prioritárias e de bens e serviços, até 31 de Dezembro de 2007;
- preparar um Orçamento Geral do Estado, para o Ano Fiscal de 2008, ajustado às necessidades reais do país, com vista à prossecução de um plano de desenvolvimento nacional integrado, que possibilite a transformação radical das condições de vida das populações, alterando desde já o Ano Fiscal para o Ano Civil.

Este Governo foi concebido a pensar em alterar o presente e o futuro próximo de Timor-Leste, através de reformas radicais que mobilizem todos os timorenses para o desígnio nacional de desenvolvimento, como condição para a melhoria da vida das populações. Queremos descentralizar o poder, dividindo administrativamente o país, para que o processo de tomada de decisões seja entregue a governos locais, para que o povo sinta que a capacidade de tomada de decisões não é monopólio do topo do poder.

A recuperação da confiança do Povo passa por lançar uma dinâmica de crescimento progressivo, capaz de combater o desemprego e as desigualdades sociais. Só com um Plano Estratégico de Desenvolvimento Económico, o povo poderá perceber e acompanhar as fases e as etapas do processo de Reconstrução Nacional, no qual, ele mesmo, o povo, será o actor fundamental.

Senhoras e Senhores

Nenhum Plano de Desenvolvimento será objectivo e realista, se oferecer a opção de industrializaçã o do país. Neste sentido, a agricultura, a pesca e a pecuária são prioridades ao desenvolvimento nacional. Timor-Leste continua no estádio rudimentar de agricultura de subsistência e há que ultrapassar, com firmeza, esta situação. Tem que se passar da fase de agricultura de subsistência para a agricultura de mercado e tem que se passar do estádio de dispersão da pequena produção, para a especialização regional de produtos. Tem que se passar do ciclo constante de secas para a infra-estruturaçã o de reservas de água e canais de irrigação, garantindo a produção e impulsionando assim de forma irreversível, o desenvolvimento da agricultura.

O Governo pretende, com a divisão administrativa do país, concretizar o plano de diversificação e intensificação de produção agrícola, para se poder estabelecer um mercado interno, que garanta o escoamento dos produtos e, como objectivo, a auto-suficiência alimentar. Sendo também possível, equacionar a médio prazo, ‘nichos de mercado’ externos.

Da mesma forma, a pesca vai ser melhor apoiada para que, no interior do país, as populações possam consumir peixe. O desenvolvimento de pequenas e médias indústrias, neste sector e outros produtos do mar, será não só uma fonte de emprego como fonte de divisas para o país.

O Governo defende que a pecuária deve ser apoiada e incentivada, de forma a garantir também as bases de desenvolvimento de pequenas e medias indústrias de carne, leite, manteiga e queijo, para o consumo interno ou, no futuro, para exportação.

Senhoras e Senhores

O Governo irá ainda desenvolver esforços no sentido de melhorar de forma sustentada a qualidade de vida de todos os timorenses, o que passa por acções políticas que tenham em vista a habitação e as obras públicas, transportes e comunicações, água, electricidade e saneamento básico em todo o País, visando a melhoria das condições de vida dos mais carenciados.

O Governo assume desde já o compromisso de desenvolver uma política ambiental, orientada pelos princípios de desenvolvimento durável, integrando harmoniosamente a componente ambiental, económica e sociocultural. Tendo em conta que esta meia-ilha é afortunada em termos de recursos naturais, enfrentamos o desafio de os valorizar e de promover uma gestão e um ordenamento do território que não desvirtue a nossa paisagem natural.

Promoveremos uma política clara de protecção à vida marítima, e especialmente aos corais, de forma a evitar a sua destruição, para os tornar no futuro, centros de atracção turística. A reflorestação também é urgente, é necessário educar as populações para evitar a contínua destruição do meioambiente e incutir valores de protecção à terra e à natureza.

O Governo no seu plano de desenvolvimento nacional, propõe-se a efectuar estudos para a preservação das bolsas florestais, de forma a incentivar uma cultura sistemática e ordenada das madeiras autóctones de valor commercial e estudos de introdução de novas madeiras, no sentido de se criar autosuficiência, reduzindo ao máximo a importação deste bem.

Senhoras e Senhores

Não é novidade que o sector privado é um parceiro essencial no desenvolvimento nacional, porque gera riqueza e emprego auto-sustentado, fora do quadro das actividades e emprego do Estado. É por isso necessário garantir que os investidores conheçam as oportunidades de investimento, e que invistam de acordo com os interesses do país.

Rever a política de investimento para fomentar o investimento externo, será um dos motores de desenvolvimento e de criação de emprego para os nossos jovens, sendo portanto necessário corrigir os erros do passado e alimentar um clima de verdadeira tolerância e respeito pelos outros, para tornar Timor-Leste num pólo de atracção do investimento estrangeiro.

O Governo aposta na criação de uma Agência Especializada de Investimento, com maior autonomia em relação ao poder político, porque uma Agência desta natureza garante mais e melhor transparência, tão necessária e fundamental ao desenvolvimento deste tipo de actividades. O Governo compromete-se a corrigir e eliminar o sistema de favoritismos que ficou estabelecido, e que tem vindo a criar uma péssima imagem ao país, em benefício das elites políticas instaladas no poder.

Também e essencialmente, o sector privado nacional vai merecer especial atenção deste Governo. Vai ser exigido a todos o cumprimento das regras elementares de formação de empresas, a fim de que as suas actividades se consolidem, progressivamente, para que possam participar activamente no desenvolvimento. Para isso, o sector privado nacional deverá receber mais apoio do Estado, sem discriminações, subordinado apenas a critérios de competência, valor do projecto, honestidade profissional e capacidade técnica, combatendo os clientelismos políticos que só prejudicam o processo de construção do país e a capacitação do empresariado nacional. A transparência na concessão de projectos e a transparência de contas anuais de cada empresa será o indicador do crescimento deste sector.

O Governo compromete-se a dar todo o apoio necessário à criação de pequenas e médias empresas, não só para valorizar os produtos nacionais mas igualmente para incentivar as actividades produtivas, criando-se dessa forma mais emprego junto das populações. O Governo também está empenhado a incentivar as cooperativas, para ultrapassar as dificuldades enfrentadas pelos pequenos produtores individuais.

Para tudo isto, também o Governo está empenhado em criar um Banco Nacional de Desenvolvimento, para oferecer créditos que impulsionem o sector privado nacional.

Senhoras e Senhores

A curto prazo, Timor-Leste terá que corrigir alguns factores que impedem o seu desenvolvimento económico, e subscrevemos por isso a proposta apresentada pelo Dr. Ramos-Horta, enquanto Primeiro Ministro do II Governo Constitucional, de criar um novo sistema fiscal simplificado a favor dos pobres e que incentive o sector privado, o investimento estrangeiro e a criação de emprego.

Também as finanças públicas são condição necessária para o desenvolvimento económico e por isso, uma gestão com transparência, rigor e verdade, é fundamental no domínio das contas públicas. Transparência e rigor na despesa, é a única forma de garantir a sustentabilidade das contas públicas a longo prazo, assegurar uma economia competitiva, bem como dar credibilidade ao Estado, perante o povo e perante a comunidade internacional.

Este Governo está apostado em criar uma Comissão Anti-Corrupção, com poderes reais de intervenção, em conjugação com o Ministério Público, para se criar a cultura de integridade, zelo e profissionalismo na Administração.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

Para a aplicação de medidas políticas arrojadas, é necessário que em primeiro lugar, o próprio Estado sofra uma transformação radical que denuncie o partidarismo existente na Administração Pública, centralista, pesada e ineficiente, que corrompe as mentalidades.

É dever deste Governo, que assumiu o compromisso político de não pactuar com esquemas e favoritismos, supervisionar os membros do Governo para que nunca coloquem os seus interesses individuais acima dos interesses colectivos e promover um ambiente de responsabilidade e integridade no Conselho de Ministros, para que seja um modelo exemplar a ser seguido por todos os agentes públicos.

A recuperação da confiança no futuro está associada ao prestígio das instituições democráticas, e a sua dignificação aos olhos dos timorenses, exige credibilidade ao sistema político, implicando reformas na sua estruturação e também no respectivo modo de agir.

O Governo vai acelerar a política de formação profissional dos servidores do Estado e o seu devido enquadramento que vele pelo sistema de carreira e promoção, com efeitos para a reforma.

Senhoras e Senhores

Investir na Educação é, em primeira análise, investir no futuro do país. O Governo irá destacar áreas prioritárias de intervenção na área de educação. O nosso plano de acção será orientado pela necessidade de reforma do sistema de ensino.

Iremos combater a proliferação de universidades privadas, sem padrões de qualidade de ensino e apostar, em alternativa, na Formação Profissional Orientada, que capacite de facto os jovens. Só assim, eles possuirão os instrumentos necessários à sua participação no desenvolvimento do país, nas áreas que são de facto essenciais e onde certamente será mais fácil a integração no mundo de trabalho, combatendo assim o problema de desemprego dos jovens.

Este Governo considera que as escolas e universidades não são só transmissoras de conhecimentos científicos e técnicos, servem também para ampliar os horizontes, desenvolver a capacidade de raciocínio, moldar actos e comportamentos. As escolas e universidades deverão, assim, ser um espaço natural para a criação de condições básicas de educação cívica, para que as crianças e jovens também possam disseminar o respeito pela dignidade humana, de praticar o bem comum e contribuir para a construção do Estado, regulado por valores democráticos e direitos cívicos e humanos.

Consideramos não menos importante o desenvolvimento físico dos jovens e, por isso, construiremos infra-estruturas de desporto em todas as escolas, para que as crianças cresçam sadias, de corpo e espírito, e progressivamente, em todos os distritos e sub-distritos.

Este Governo vai considerar seriamente uma educação primária capaz e gratuita a todas as crianças de Timor-Leste, aliviando o fardo de dezenas de milhares de famílias. O Governo vai incentivar, cada ano, prémios aos melhores alunos, em todo o País e implementar uma política rigorosa e transparente de bolsas de estudo, para elevar a capacidade intelectual da nova geração.

Senhoras e Senhores

Em relação à saúde, devo saudar o Dr. António Maria de Araújo, pelo magnífico trabalho desenvolvido neste sector. Este Governo vai prosseguir a política definida anteriormente, mas dedicará especial atenção ao desenvolvimento de um sistema nacional de saúde que garanta a prestação de melhores cuidados de saúde à população. Procurará conjugar este objective com um sistema também preventivo da doença e uma educação sanitária e alimentar, crucial sobretudo nas áreas mais remotas do país. Somos um país de pequena dimensão e não há justificação para que a nossa população continue a viver em núcleos isolados, à margem dos serviços básicos.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

Elevar a qualidade do sistema democrático em Timor-Leste, implica necessariamente fazer dos sistemas de justiça e segurança, instrumentos de sucesso para uma plena cidadania.

A Justiça constitui um dos fins essenciais do Estado, pela sua indeclinável função. Promover uma cultura de justiça, credível, independente e imparcial, no sistema judicial timorense, implica uma melhoria na administração da Justiça e uma magistratura mais activa.

A democracia, o desenvolvimento e o bem-estar das populações, dependem essencialmente de uma Justiça que funcione. A aprovação de diplomas legislativos essenciais, como é o caso do Código Penal, vai merecer imediata atenção. Mas isto só não chegará, porque se torna uma prioridade dar uma capacidade de intervenção permanente nos Tribunais Distritais, que carecem ainda de instalações, equipamentos e administração.

Este Governo propõe-se a criar um Tribunal de contas, a fim de responsabilizar qualquer Governo, hoje e no futuro, dos actos praticados na gestão dos dinheiros públicos.

Senhoras e Senhores

A Segurança é também uma área fundamental, um dos pilares do Estado, pois este tem a obrigação de zelar pela dignidade e bem-estar dos cidadãos, assim como pela segurança das pessoas e dos seus bens. Iremos, enquanto Governo, prosseguir com a política de inovação para a Polícia Nacional de Timor-Leste, tornando-a verdadeiramente profissional, apartidária e merecedora da confiança das pessoas e das comunidades

Estaremos empenhados na revisão do sector da segurança e implementaremos mecanismos que capacitem a PNTL com recursos humanos e materiais necessários ao cumprimento da sua missão.

Na área da Defesa, este Governo estará empenhado em rever uma política para as Forças Armadas, tornando os militares, exemplo nos seus comportamentos profissionais e nos seus actos, não só para que tomem parte activa na reconstrução do país, como para participarem com dignidade nas missões internacionais, contribuindo para a Paz Mundial, que é o anseio de todos os Povos.

Iremos, para isso, reforçar o papel das Forças Armadas, criando diplomas adequados à melhoria do desempenho das Forças, nomeadamente a Lei de Defesa Nacional e das Forças Armadas, de forma a desenhar uma estrutura e estabelecer uma metodologia que defina o Sistema de Forças Nacional e o seu dispositivo, assim como os meios humanos e materiais necessários para o cumprimento das missões. Torna-se urgente também implementar as reformas que se aproximam decorrentes do Grupo de Estudo da Força 2020, para a edificação da capacidade institucional das F-FDTL.

Uma política concertada na área da Defesa e na área de Segurança é fundamental para garantir a liberdade e soberania do país e a consolidação de um Estado de Direito Democrático, por isso, não é por mero acaso que estas duas áreas prioritárias estarão afectas ao Gabinete do Primeiro-Ministro.

Senhoras e Senhores

É parte integrante de um Estado de Direito Democrático, o direito à informação e é neste sentido que assumimos o compromisso de garantir a liberdade de imprensa e a independência dos órgãos públicos de comunicação social perante o poder político e económico. Queremos ainda contribuir para um serviço público de rádio e televisão que proteja e divulgue a cultura e as tradições timorenses, e garantir que haja expressão do pluralismo de opinião, de forma a desenvolver uma massa crítica e responsável no nosso país.

Consideramos ainda que os Órgãos de Comunicação Social poderão ser um veículo importante para desenvolver acções de educação cívica e de promoção de boa cidadania e, de forma inovadora, contribuir para a compreensão do processo político nacional, contando para isso com o apoio dos Órgãos de Soberania.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

Nenhum projecto político poderá ter sucesso sem tomar em consideração outras áreas fundamentais ao processo de estabilização nacional.

Empenhar-nos- emos em políticas sociais de luta contra a pobreza e contra as desigualdades sociais, pois não podemos fechar os olhos àquilo que vemos, cada vez que circulamos pelo país, onde grande parte da população, em especial as crianças, não têm ainda acesso a bens e serviços essenciais, chegando a tocar o desrespeito pela condição humana.

Não descansaremos enquanto os nossos idosos, depois de 24 anos de sacrifícios, continuam a padecer de fome, de frio, de doença e de isolamento nos seu últimos anos de vida. Estes, assim como os aleijados, as viúvas e órfãos da nossa liberdade, serão alvo de projectos concretos que assegurem a sua protecção.

Na continuação dos esforços já desenvolvidos, e que eu impulsionei na medida que constitucionalmente me foi possível, garanto desde já, que não iremos descurar aquilo que é devido aos veteranos.

Este Governo propõe-se a:

a) acelerar o processo de pensões de subsistência e sobrevivência, previstas na Lei nº 3/2006 do Estatuto dos Combatentes de Libertação Nacional;
b) acelerar o processo de desmobilização dos membros das FALINTIL, com vista à concessão do direito à pensão especial de reforma, com efeito retroactivo desde Janeiro de 2000;
c) Rever a Lei nº 3/2006 do Estatuto dos Combatentes de Libertação Nacional, relativamente aos Quadros da organização clandestina, para terem o direito também a uma pensão especial de reforma, com efeito retroactivo desde Janeiro de 2000;
d) Proceder à concessão de um subsídio mensal permanente aos Chefes de Suco e Aldeia, a fim de os libertar de outras actividades para o sustento da família;
e) Fazer imediata revisão dos salários das F-FDTL e PNTL;
f) Fazer um estudo sobre subsídios de isolamento aos funcionários que prestam serviço em áreas isoladas e com precárias condições de manutenção da família;
g) Proceder a uma avaliação efectiva das ONG’s nacionais, que tenham demonstrado um perfil exemplar de independência, dedicação e boa prestação de contas. Este será um passo para o Governo estudar a forma de apoio concreto, para as capacitar como parceiros no desenvolvimento cívico, social e económico, com deveres para com toda a comunidade. Estabelecer- se-á um mecanismo de responsabilizaçã o e transparência de contas;
h) Estabelecer um MOU com a Igreja, tornando-a recipiente de um subsídio anual, que corresponda às suas próprias actividades, designadamente na educação e formação profissional e na área socioeconómico e cultural. Haverá um mecanismo de responsabilizaçã o e transparência de contas.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

Somos a prova viva de que a estabilidade de um país não se limita aos seus esforços internos. Temos, desde o início de nossa existência como Estado soberano, cultivado uma política de amizade e de cooperação com vários países e em especial com aqueles que estão mais próximos, em termos físicos e históricos, e refiro-me naturalmente à Austrália, Indonésia e Portugal.

Este Governo irá reforçar estes laços de amizade e promover uma cooperação ainda mais estreita com estes governos e também promover laços de cooperação com todos os países do mundo, guiados pelos princípios de respeito mútuo e de não ingerência nos assuntos internos de cada Estado.

Comprometemo- nos ainda a passar à prática os princípios universais dos direitos humanos a que aderimos, consagrados nas Convenções Internacionais, e a participar da melhor forma nas decisões da ONU, que levem a reforçar os valores democráticos do diálogo, da tolerância e da paz, dignificando assim a presença de Timor-Leste nesta Organização Mundial.

Vamos continuar o processo de adesão à ASEAN e a participar no Fórum do Pacífico Sul, na ACP e APEC, para alargar as oportunidades de cooperação, especialmente económica, em benefício do povo de Timor-Leste.

Manteremos as relações já existentes com o espaço da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, que detém uma expressão de universalismo, já que por esse modo nos relacionamos com África, com a América e com a Europa.

Este Governo conta com todos os parceiros da Sociedade Civil para levar a bom termo todos estes objectivos a que nos comprometemos, não apenas através do diálogo mas também visando a intervenção da Sociedade Civil na capacitação do Estado, exigindo deste a sua melhor actuação. Para efectuar as mudanças necessárias, contamos ainda com a participação imprescindível da Igreja Católica, instituição secular, sólida e conciliadora no seio da sociedade timorense. Este Governo convida a Igreja Católica a ser parte activa na mudança das mentalidades para uma cultura de paz, tolerância e igualdade, assumindo um papel ainda mais preponderante na educação e formação dos timorenses, no desenvolvimento humano e no tão almejado combate à pobreza.

Reforçar a cooperação com outras confissões religiosas, é também um dos objectivos deste Governo, convictos de que poderão dar contributos valiosos ao desenvolvimento da pessoa humana e por consequência a toda a sociedade timorense.

As ONG’s Nacionais e Internacionais têm tido sempre um papel activo no desenvolvimento do país e queremos reiterar o convite para participarem neste grande projecto de transformação de Timor-Leste, e para isso, convidamo-las desde já a apresentarem propostas e sugestões ao Governo para melhor resolver os problemas comunitários, pois estas organizações são um interlocutor privilegiado com as comunidades.

Não posso concluir sem agradecer às Nações Unidas o apoio com que tem privilegiado o povo de Timor-Leste. Também quero agradecer aos Governos dos quatro países amigos, Austrália, Malásia, Nova Zelândia e Portugal, que responderam sem hesitação ao nosso primeiro apelo durante a crise e se têm mantido, em território nacional, de molde a garantir a ordem pública e a repor a normalidade e segurança em todo o país. A presença da comunidade internacional, através da ONU, possibilitou que o povo pudesse exercer tranquilamente o direito de voto e escolher, democraticamente, os seus representantes. Para todos esses homens e mulheres, a nossa gratidão mais profunda.

Suas Excelências
Senhoras e Senhores

A AMP está ciente da responsabilidade que está a assumir perante aqueles que depositaram em nós a sua confiança política e também perante o eleitorado de Baucau, Cova Lima, Lautém e Viqueque e todos aqueles que não votaram em nós.

Para as almas mais inquietas, gostaria de deixar bem claro que o Governo da AMP não vai ser um governo de interesses partidários, nem nunca poderia ser. Isso trairia o espírito de solidariedade que assumimos perante o povo, pois este é o início, o motor e o fim último da nossa missão.

Para os que votaram na FRETILIN, a AMP quer deixar aqui uma palavra de conforto e um compromisso político: as vossas aspirações e as vossas necessidades serão para este governo, encaradas com a seriedade que elas merecem. Também me dirijo a todos os funcionários, administradores e membros da PNTL, que têm vindo a actuar como membros activos da FRETILIN, afirmando que o Governo da AMP não exercerá nenhuma perseguição política a quem quer que seja. Contudo, a nossa política é de correcção e reforma das instituições e das mentalidades, sob critérios justos e transparentes.

A AMP compromete-se a fazer reformas em prol da melhoria da governação no nosso país e estamos cientes que o governo sozinho não poderá assumir cabalmente esta prioridade de interesse nacional, sem a séria e honesta solidariedade institucional de todos os órgãos de soberania, na sua relação estreita com Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, e Vossa Excelência, Senhor Presidente do Parlamento Nacional.

Os órgãos de soberania que recentemente tomaram posse, assumiram planos ambiciosos para o desenvolvimento e estabilidade do país. Refiro como exemplo, o plano de acção de Vossa Excelência, Senhor Presidente da República, de combate à pobreza, no âmbito do exercício de uma presidência aberta para os pobres.

É obrigação do Parlamento Nacional e do Governo apoiar incondicionalmente este plano, porque não há planos do Presidente, do Parlamento e do Governo, é todo um povo que precisa de ser servido e é aos órgãos de soberania que cabe executar esta missão.

Para terminar, apelo ao Povo para nunca diminuir o grau de exigência com os seus representantes nos órgãos de soberania e em especial no governo.

Cabe-nos a nós conduzir e executar a política geral do país, cabe ao Povo chamar-nos à responsabilidade sempre que falharmos. O projecto que apresentei é ambicioso e só chegaremos à meta final, se todos trabalharmos juntos, vencendo desafios e obstáculos em diálogo permanente – se, por alguma razão, sentirem que as vossas vozes não têm eco, experimentem gritar!

Mas não se calem!

Contudo, todos juntos digamos, de uma vez para sempre: Não, à violência!

Viva Timor-Leste!


por Kay Rala Xanana Gusmão
Primeiro-Ministro de Timor-Leste


in FORUM HAKSESUK: http://www.freewebs.com/forum-haksesuk/discurso_pm_xanana_gusmao.htm