CNRT/Congresso Nacional
Presidência
CARTA ABERTA A TODOS OS TIMORENSES
Presidência
CARTA ABERTA A TODOS OS TIMORENSES
Queridos compatriotas
Não foi surpresa nenhuma, quando tomei conhecimento ontem, de regresso da visita a todo o Distrito de Cova Lima, do conteúdo das notícias publicadas no Sydney Morning Herald. Compreendo que os jornalistas têm o direito de fazer notícias e o direito de aparecerem sempre diferentes dos outros
Contudo, a notícia deturpou as coisas e é por isso que venho aclarar a todos os timorenses.
1. Como todos sabem, a FRETILIN saiu do CNRT, logo depois do Congresso, porque o Congresso foi considerado, por políticos e democratas, como tendo sido manipulado para eu continuar como Presidente do CNRT e, somando-se a isso, o facto de não ter havido nenhum vice-Presidente do CNRT. A UDT também não quis participar no Conselho Permanente do CNRT/CN, por razões de competências ou não competências daquele Órgão.
O Conselho Nacional estava a demorar a ser constituído, para imediatamente começar os seus trabalhos. Face a isto, porque estavam previstos 7 lugares para o CNRT e porque só havia 6 partidos para participar, como representantes do CNRT, eu ofereci-me para preencher o outro lugar.
Mas, antes da tomada de posse do CN, o CCN reuniu pela última vez, para aumentar o número de membros do CN. já que a FRETILIN e a UDT estavam dispostas a participar (UDT dentro do CNRT, e FRETILIN fora do CNRT).
O meu erro foi não ter, desde aí, retirado o nome como candidato para o CN.
2. Desde o inicio do funcionamento do CN, não pude compatibilizar as minhas actividades de Presidente do CNRT com as funções de Presidente do CN.
Esta última responsabilidade estava a ser posta em causa pelos trabalhos que devo realizar como Presidente do CNRT e que me é exigido nesta fase de definição do processo político de transição. Porque eu tinha programas de saídas para os distritos da parte ocidental do território, eu continuava ausente de um órgão criado para debater assuntos importantíssimos da vida nacional.
Assim, solicitei aos membros do CN que considerassem, EM TEMPO OPORTUNO, o meu pedido de demissão, por materialmente não me sentir capaz para assumir as duas responsabilidades ao mesmo tempo. REPITO: O meu erro foi não ter retirado o meu nome da lista dos candidatos, depois de a FRETILIN e a UDT terem aparecido para participar no CN.
O meu pedido de demissão foi, quanto a mim, uma posição transparente e natural em qualquer contexto político democrático. Se eu tentasse, por todos os meios, reter a minha posição no CN, sem ir às suas sessões e com mira talvez de receber algum pagamento por ser Presidente do órgão, concordo que tat atitude é que deveria ser posta em causa não o contrário. Digo não o contrário, pela simples razão de que Tirnor Lorosa’e tem a felicidade de poder contar com inúmeros quadros e filhas e filhos com enormes capacidades. O Conselho Nacional, em particular, é constituído por membros que já provaram, neste curto espaço de tempo, a sua dedicação e empenhamento e, diariamente, têm revelado vontade e determinação em trabalhar na preparação institucional da independência do nosso País.
3 - A minha ausência do CN não só não faz absolutamente falta alguma, como não
dignifica este mesmo órgão, que todos consideramos vital nesta fase de transição para a independência.
É absolutamente incorrecto que o pedido de demissão foi uma reacção minha à negativa por parte do CN à calendarizaçâo do processo político proposto pela Presidência do CNRT.
Considero que, nesta fase do nosso processo político, a assistência que devo dar à população é extremamente importante.
Eu compreendo e todos sabemos que um partido é constituído para disputar o poder político, e é esta a sua essência. Contudo. existe uma situação que muita gente não quer ter em conta e que é a situação generalizada de más condições de vida da população: muita gente ainda sem um tecto, muita gente sem assistência médica, pouquíssimas salas de aula sem carteiras, uma economia parada na maior parte do país com a população sem capacidade de vender os seus produtos, etc., etc.
Mesmo assim, alguns grupos políticos já se lançaram a criar confusão no povo, alguns grupos já iniciaram o recenseamento da população, outros obrigam a população a aderir, utilizando possivel acção de retaliação das FALINTIL como ameaça. Alguns grupos recrutam os milícias, regressados. prometendo que não haverá justiça quando eles estiverem no poder.
Numa situação ainda de muita fome para a população, outros grupos semeiam bandeiras em todo o lado, semeando também um ambiente de conflituosidade no seio da população. A violência, a mentira, a exploração psicológica e emocional do povo estão a ganhar forma. A tensão política existente faz-nos lembrar os alvores democráticos de 1974. Nós prevemos que a actual corrida ao poder, por parte dos partidos, que até já estão a tentar controlar a população para esse efeito, vai levar, no próximo ano, a uma repetição do que aconteceu em 1975.
O CNRT é a única força mobilizadora do povo para a unidade e estabilidade, para um ambiente de paz e harmonia entre todos os timorenses. Sabemos que a ‘unidade nacional* em termos de partidos não será conseguida, como sempre foi aparente, durante todos os anos da luta, em termos de liderança timorense e todos sabem disso.
Mas o CNRT sabe que pode continuar a apelar ao povo para defender o seu direito básico, nesta fase dificil: o direito de viver em tranquilidade, o direito de não ver repetidos erros que provocaram a divisão do povo, que provocaram violência e mortandade.
E eu estou empenhado nesta missão do CNRT de esclarecer o povo para se prevenir das consequências que a luta ao poder pode provocar.
Iniciei, na semana passada, um conjunto de visitas aos distritos, começando por OeKusi e Sobonaro, Maliana, Balibó e Lolotoe, terminando em Suai, Fohorém, Fatumea e Fatu Lulik.
E tenho programas para percorrer os distritos de Ermera, Sarne, Ainaro e Manatuto.
Por causa destas visitas, eu não podia estar presente nas sessões do Conselho Nacional e tem-se já provado que este Órgão tem funcionado com capacidade e está à altura das suas enormes responsabilidades. As filhas e os filhos do nosso Povo, que estão no CN, não estão influenciados de maneira nenhuma pelas minhas constantes ausências. Mas estas constantes ausências, por imperativo dos superiores interesses do nosso povo, não dignificam o Órgão máximo constituído nesta fase de transição.
O CN, assim como o Gabinete, devem ser as forjas para a nova liderança timorense, e o que o nosso Povo necessita é de lideres capazes de perceber as necessidades do povo e não apenas engajados na corrida ao poder.
Como Presidente do CNRT, tenho as seguintes áreas sob a minha responsabilidade:
- acompanhamento do processo político
- trabalhos com vista à consciencialização democrática da população e fortalecimento da sociedade civil
- defesa
Espero, com esta explanação, ter aclarado a deturpação da notícia que surgiu no SMH.
Na sociedade democrática que queremos construir, tenho vindo a afirmar e a esclarecer ao povo que temos que deixar que novos líderes se afirmem, porque as exigências da independência são maiores e mais difíceis do que uma luta armada.
O meu pedido de resignação do Conselho Nacional deve ser visto neste contexto. O país precisa de democratas e não de autocratas. Para a independéncia, o povo precisa de chefes qualificados e o meu empenhamento politico deve ser dirigido a criar condições para a afirmação de tantos outros que existem sobretudo nos partidos históricos.
Continuo a preferir pintar e escrever, pois no mínimo terei tempo e dinheiro para construir urna palapa para mim.
Até lá, desejo reafirmar que o Povo, as suas dificuldades e as suas aspirações estão, como sempre estiveram, em primeiro lugar nas minhas opções. Mas servir o Povo não significará que me tenho que acomodar às ambições dos partidos Os partidos têm o dever de saber o que é melhor para o Povo que tanto sofreu, obrigando-se assim a não violar o direito do povo de viver em paz, em harmonia e tolerância.
Díli, 5 de Dezembro de 2000
KAY RALA XANANA GUSMÃO
PRESIDENTE DO CNRT/CN
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