quarta-feira, 29 de novembro de 2006

A fabulosa mensagem de Xanana Gusmão - 22 Junho 2006

Mensagem de S.E. o Presidente da República


Povo Amado e Sofredor aos 
Líderes e Membros da FRETILIN



Eu peço licença aos companheiros para tecer algumas palavras acerca da FRETILIN, porque conheço a FRETILIN melhor do que alguns delegados ou todos aqueles que estiveram no congresso há pouco realizado, sabendo apenas levantar a mão porque receiam perder o emprego, para alimentar a mulher e os filhos, porque recebem dinheiro por trás (eu sei de uma pessoa que recebeu cem mil dólares para comprar todos os Delegados, não se sabe se distribuiu bem ou … deu cinco mil, cinco mil para os delegados, e meteu esse dinheiro no seu bolso). Porém não importa, não se sabe até onde pode enriquecer, isto é um assunto privado, por isso não é um problema do povo, porque esse dinheiro é do partido.

Queridos

Antigamente eu era membro do Comité Central da FRETILIN, até à minha saída em 1986. Se não fosse a crise e a violência que surgiram depois do Congresso da FRETILIN, na qualidade de Presidente da República, eu tenho que velar para a vida das instituições democráticas, eu tenho que criticar duramente o Congresso que decorreu nos dias 17 a 19 de Maio passado. Este Congresso viola a alínea c), do artigo 18º, Lei nº 3/2004, acerca dos Partidos Políticos, que diz o seguinte: os titulares (aqueles que desempenham funções), dos órgãos directivos (dos partidos), todos, têm de ser eleitos, por voto directo e secreto pelos militantes para que sejam representativos dos militantes. O artigo 46º da Constituição da RDTL, no seu nº 3, afirma o seguinte: “a constituição e a organização dos partidos políticos são reguladas por lei”. Essa lei é a Lei nº 3/2004.

Nenhuma lei que surja no nosso País, pode violar a constituição. Todas as organizações são reguladas pela lei, não podem violar esta lei. Isto é um princípio elementar do Direito, e o Governo que tem muitos doutores e doutoras que fizeram a lei, depois violam a lei de acordo com os seus interesses.

Como eles é que sabem tudo, neste cantinho da terra toda a gente é ‘supermi’, o Congresso da FRETLIN, realizado há pouco tempo, pode violar a lei que eles próprios fizeram, com a maioria no Parlamento e com os intelectuais todos no Governo que escreveram esta lei, para anular o sistema de voto secreto, para o voto de braço no ar, levando todo o povo a rir e a ficar triste, para a comédia que o grande e histórico partido fez para registar na nossa história futura. (Porque se é para ficar registada na história, eu também baptizo GMT- Gedung Matahari Terbit [Casa do nascer do Sol] para GAT- Geddung Angkat Tangan [Edifício do Braço no Ar], para que não exista mais nenhum partido na nossa terra, para brincar com o povo, para violar aquelas leis que os políticos escreveram e aprovaram).

Queridos

A FRETILIN, é um partido histórico como todos nós sabemos. No dia 20 de Maio de 1974, surgiu a ASDT (Associação Social-Democrática de Timor), com a influência de alguns estudantes universitários timorenses que estavam a estudar em Portugal nessa altura, onde se inclui Abílio Araújo, e criaram no dia 11 de Setembro daquele ano a ASDT/FRETILIN, mais tarde transformado em FRETILIN. Esses jovens universitários introduziram uma orientação revolucionária, que aprenderam no tempo colonial fascista de Salazar e Marcelo Caetano.

E todos nós podemos constatar: FRETILIN, significa Frente Revolucionária. Em Maio de 1977, em Laline, na reunião do Comité Central de FRETILIN, foi adoptada a ideologia marxista-leninista. Eu também participei como membro do Comité Central. Alguns companheiros que ainda estão vivos também participaram como membros do Comité Central, como Abel Ximenes Larisina, Filomeno Paixão, Feliciano de Fátima e Ma Huno.

Porém eu quero dizer-vos que em 1975, Timor era muito atrasado mas a tecnologia sofreu grandes avanços nos últimos tempos, tornando o mundo mais pequeno. Eu acredito plenamente que se Nicolau Lobato, Sahe, Carvarino, Hamis Bassarewa, César Mau-Laka, Hélio Pina e Inácio Fonseca e outros, tivessem sobrevivido até 2006, até à era pós-guerra fria, era da globalização, era da tecnologia, todos eles concluiriam que para o Timor que tanto amavam, dando as suas vidas, a antiga ideologia não serve.

Hoje, um pequeno grupo, vindo do exterior, quer repetir os comportamentos que nós tivemos de 1975 até 1978.

De acordo com o que todos nós sabemos, em Agosto de 1975, a UDT fez o golpe para expulsar os comunistas da nossa terra, iniciando a guerra entre os timorenses. Em 2006, a FRETILIN quer fazer um golpe para matar a democracia que eles próprios escreveram na Constituição. O problema da distribuição das armas não tem a ver com a situação que estamos a viver, já estava nos seus planos, distribuíram para as eleições de 2007. Por isso é que estamos sempre a ouvir eles dizerem: só a FRETILIN pode criar a estabilidade ou a instabilidade.

Quando as bases de apoio se desintegraram em 1978, os companheiros da Ponta Leste e com este servo, tentaram organizar-se para procurar os companheiros dos outros sectores para encontrarem-se com os companheiros de Bazartete e Liquiça, Same e Ainaro. Se não acreditarem, perguntem aos companheiros veteranos que estão na F-FDTL, para não dizerem que eu inventei, para minha vaidade pessoal como algumas pessoas que eu conheço que entraram na FRETILIN, que nos olham de lado, como se fossem eles os únicos a fazerem a guerra.

Queridos companheiros
 Membros da FRETILIN

Em Março de 1981, na Conferência de Laline, reorganizou-se a resistência, e conforme nós costumamos dizer, passou-se para a fase da guerrilha. Tal como a crise que estamos agora a viver, no Conselho de Estado ficou decidido definir os problemas prioritários, uma vez que não temos força para resolver todas as coisas de uma só vez; assim, em 1981, a nossa primeira prioridade foi a reorganização.

Por isso, nós também, em 1981, agarrámos novamente na orientação “ideológica” que recebemos dos nossos intelectuais e chefes. Em 1983, durante o período de cessar-fogo com o “TNI”, de Março até Agosto, começámos a falar sobre democracia. Por isso, em 1984, para corrigir os erros do EMG-FALINTIL, na região central, apareceu o “CC Hudi Laran” que não quis aceitar a mudança política que nós vimos ser a melhor para o nosso processo de resistência. Acerca disso, muitos companheiros que ainda estão vivos podem contar melhor com floreados, senão podem pensar que eu é que quero mostrar-me como se eu fosse o único a escrever a nossa história.

Eu comecei a enviar cartas para o exterior para a DFSE (Delegação da FRETILIN em Serviço no Exterior) – podem perguntar ao Sr. Abílio Araújo que nós escolhemos em Março de 1981 como Presidente da FRETILIN e, de acordo com os estatutos do partido, Presidente da RDTL.

Eu também disse para o exterior que no interior do território a Unidade Nacional já estava segura desde Tutuala até à fronteira passando por Oecussi e Jaco, que a igreja também se juntou, que as pessoas dos outros partidos também participavam na resistência. Por isso, eu escrevi aos companheiros no exterior para se sentarem com a UDT para se reconciliarem.

No exterior, em Portugal, em Moçambique e também na Austrália, talvez a “INTEL” também vigiava os timorenses lá fora, não se mexiam como se os espias os seguissem, como se fossem as suas sombras e por causa disso demoraram tanto tempo para erguerem a “Convergência Nacionalista” onde surgiram vários problemas – podem perguntar aos elementos da FRETILIN no exterior, ao Sr. João Carrascalão e ao Sr. Vicente Guterres. Eu cito o nome deles só para dizer que, se pensam que eu minto, peçam-lhes para vos informar.

Porém que o vento leve estas palavras até aos irmãos que estão lá fora, que os Gadapaski [Jovens Guardas em Defesa da Integração] estão no nosso território, castigam os jovens até ficarem bem moídos. Assim, em Moçambique, Rogério tentou adquirir pengalaman [experiência] para se matarem uns aos outros e Ramos-Horta ficou preso. Naquele tempo, o Presidente Chissano, ainda como Ministro dos Negócios Estrangeiros, é que foi libertá-lo. Se acharem que estou a mentir, perguntem-lhes porque eles é que estavam em paz para estudarem, para serem doutores, durante 24 anos em Moçambique.

Feita a Convergência Nacionalista em Lisboa, no mato eu estava muito feliz, pelos passos dados em frente. Em Dezembro de 1986, eu criei o Conselho Nacional da Resistência Maubere, deixei a FRETILIN, porque sendo comandante das FALINTI ASWAIN eu tinha que pôr as FALINTIL fora do Partido.

Assim as FALINTIL como força de libertação de todo o povo, de todos os partidos, de toda a população, Loromuno, Lorosae, Tacifeto, Tacimane, prolongando Ramelau até Matebian.

Eu disse para os que estavam no exterior, que como comandante das FALINTIL, eu é que comandava a luta. Também continuava a ter o meu respeito pela FRETILIN, com os membros do Comité Central, que estavam comigo no mato integrados no CNRM.

Lu-Olo, disse que durante os 24 anos, transportava a bandeira da FRETILIN no seu saco; talvez fosse verdade, porém eu nunca vi. Quando eu andava como membro do Comité Central da FRETILIN, fui até o centro do país para organizar de novo a resistência, eu lembro-me que ele, Lu-Olo, estava escondido em Builó. Talvez estivesse a tecer o saco para guardar a bandeira da FRETILIN. Lu-Olo diz também que quem abandonou a FRETILIN é traidor e não tem história. Palavras ocas sem sentido, porque se é traidor, eu sou o primeiro traidor, eu sou o maior traidor deste povo e desta terra. Deixei a FRETILIN para libertar a nossa terra e todo o nosso povo. Porque eu não matei a FRETILIN e continuo a respeitar a FRETILIN, assim Lu-Olo pode ser Presidente para ser o sábio que levanta primeiro o cartão no Parlamento Nacional, para a maioria seguir, votando contra ou a favor. Se eu me sentisse como traidor sem história, para regressar à FRETILIN, Lu-Olo nunca chegaria a ser Presidente da FRETILIN alguma vez.



Companheiros
 Membros da FRETILIN

Como eu disse atrás houve um grande protesto vindo do exterior, dizendo que eu estava a matar a FRETILIN. Abílio Araújo escreveu aos companheiros da FRETILIN para se reorganizarem. Nós reunimo-nos. Ma Huno, Mau Hodu, Konis Santana, como membros do Comité Central da FRETILIN e eu, decidimos despromover o Abílio Araújo, porque durante a guerra, nós não podíamos receber ordens do exterior, porque no exterior eles é que tinham que seguir orientações do interior.

Porque no mato, recebíamos jornais de Portugal, diversas informações, também ouvíamos rádio e sabíamos que eles no exterior, no seio da própria FRETILIN, não se davam bem, não estavam unidos. Perguntem ao José Luís Guterres, Ramos-Horta e Abílio Araújo, se estas coisas que eu digo são verdadeiras.

Nós vemos que em vez de colocar os seus pensamentos no sofrimento do povo, eles comiam-se uns aos outros para se apoderar da cadeira do Presidente da FRETILIN e depois tentar comandar a luta do exterior. Porque no mato não havia ninguém em busca de cadeiras, apenas procuravam servir para levar a luta para frente, eles os três disseram-me que nenhum deles queria ser Presidente da FRETILIN. Assim, nós decidimos criar a CDF (Comissão Directiva da FRETILIN) para evitar que os intelectuais, no exterior, entrassem em conflito para serem Presidente da FRETILIN. Se os companheiros não acreditarem, perguntem ao Lu-Olo, naquele momento, onde estava ele? Se ele estava naquela reunião ele pode confirmar se eu estou a mentir, que estas coisas estão a ser inventadas por mim, porque não estão correctas.

Perguntem ao Lu-Olo, porque é que mais tarde, tomou ele sozinho a Comissão Directiva da FRETILIN no mato. Não é porque Ma Huno e Mau Hodu foram capturados e Konis morreu? Neste mundo, algumas pessoas esquecem rapidamente os mortos que lutaram pela independência, pior do que isso, cospem para cima das suas campas.

No mato nós também lemos as acusações vindas da Amnistia Internacional e de organizações de direitos humanos, de que a FRETILIN também cometeu crimes. Eu mandei uma mensagem para o exterior, reconhecendo que FRETILIN matou pessoas, devido a problemas ideológicos, estava arrependida por isso. No exterior, todos ficaram zangados comigo, Abílio Araújo declarou de imediato que não, e que as coisas que eu disse eram mentira.

A partir daí, eu também cortei as relações com eles porque era através desses relatórios e informações que eu lhes enviava, que eles falavam para o mundo. Até 1989, eu enviei as informações e relatórios para a CDPM (Comissão para os Direitos do Povo Maubere) para utilização dos amigos portugueses.


Companheiros membros da FRETILIN

Em 1989, eu estava em Ainaro, recebi uma carta do Rogério Lobato acusando os outros no exterior, de que não faziam nada, dizendo que a luta estava acabada, e que todos tinham de se submeter à justiça popular. Rogério informou-me nessa carta, que Mari Alkatiri criava coelhos e galos em Maputo.

Eu recebi, em 1990, uma carta de José Ramos-Horta oferecendo-se para ser meu Representante Especial lá fora. Eu estava escondido em Becora e escrevi-lhe dizendo que concordava, mas tinha de seguir os princípios e as orientações políticas do CNRM, também seguindo as minhas palavras. Ele respondeu-me, dizendo que também saiu da FRETILIN para servir a luta. Se os companheiros não acreditarem, perguntem ao Ramos-Horta.

Em 1991, em Novembro, em Santa Cruz, alguns companheiros puxavam mais pela FRETILIN. Eu respeito o vosso sofrimento mas não podem atirar o pensamento e as acções dos outros para a lama. Assim, nós não temos honestidade política. Não podemos nomear apenas a bandeira da FRETILIN, porque eu também dei orientações para levarem as bandeiras da UDT e de Portugal, seguindo a resolução da ONU, Portugal continuava a ser a “potência administrante”.

A manifestação era para pedir a solução pacífica, sob a égide das Nações Unidas e a participação de Portugal e dos partidos políticos. Pedi com veemência que não podiam dizer que era uma iniciativa da FRETILIN, que não era, porque havia um comando da luta, do CNRM.

Em finais 1998, dei poderes ao Manuel Tilman, Padre Francisco Fernandes, Padre Domingos Maubere e o Padre Filomeno Jacob para irem a Portugal e ajudarem Ramos-Horta, a FRETILIN e a UDT, a organizar a conferência para alterar CNRM para CNRT, para reunir todos os timorenses no seu seio. Porque a UDT não aceitava a palavra Maubere e queria ‘T’ de timorense. Se não acreditarem, perguntem ao Sr. João Carrascalão e aos outros que estavam no exterior.

Queridos
 Companheiros membros da FRETILIN

Em 1998, se eu não me engano, no período da Reformasi na Indonésia, eu mandei Mau Hodu a Sydney e escrevi à FRETILIN para se organizar como partido, para mostrarem a sua orientação político-ideológica. Foi sob o chapéu do CNRM e do CNRT que o Povo ganhou em Agosto de 1999. Isto é história, história da resistência, história do sofrimento, história de sangue. Hoje em dia, nós ouvimos que só a FRETILIN é que fez a luta. Não importa, vocês é que são os donos da luta, aceitamos, não deitem areia para os olhos do povo porque é todo o povo que vota e não apenas a FRETILIN.

Em Maio de 2000, a FRETILIN convidou-me a falar na sua Conferência, no GMT [Ginásio], neste momento rebaptizado GAT. Pedi três coisas à FRETILIN:

- primeiro, rever, reavaliar o caso de Xavier do Amaral, porque ele não é um traidor na nossa terra, apenas porque não aceitou a ideologia adoptada pelo Comité Central, em Laline, em Maio de 1977.

- segundo, para limparem o nome de todos os que a FRETILIN assassinou porque os considerava traidores, mas que não eram traidores, apenas não aceitavam a ideologia marxista-leninista, e para que as suas famílias possam estar descansadas.

- terceiro, que a FRETILIN pedisse desculpa ao Povo, sobretudo aos familiares das vítimas.

Naquela Conferência eu disse isto: “Como membro do Comité Central da FRETILIN, desde o início até meados da guerra, todas as coisas boas que a FRETILIN fez, eu também fiz parte, as coisas más que a FRETILIN, porventura, tenha feito, eu também tenho a minha responsabilidade. Não é por eu ter deixado a FRETILIN que lavo as minhas mãos.

Eu também pedi, caso a FRETILIN tomasse uma decisão política acerca destes pedidos, que eu próprio iria ter com o povo e pedir desculpa e explicar as razões e pedir às famílias para compreenderem os erros cometidos no passado.

Passados estes dias, convidaram-me para ir à festa da FRETILIN, dia 20 de Maio de 2000, no Estádio e, depois do discurso de Lu-Olo, eu perguntei-lhe e ao Mari acerca dos pedidos que fiz na Conferência. Eles responderam que tinham constituído uma comissão para tratar desses assuntos.

Em Agosto de 2000, no Congresso do CNRT, a FRETILIN isolou-se, saindo do CNRT. Nós permanecemos calmos, continuámos a trabalhar seguindo o processo político que a UNTAET delineava, até Junho de 2001, data em que foi dissolvido o CNRT, porque terminara a sua missão.

Em Janeiro de 2000, Ramos-Horta fez-me saber que era melhor falar com o Mari. Eu respondi que foi a FRETILIN que abriu a porta do CNRT para sair e que ninguém a fechou, pelo que se quiserem voltar que o fizessem. Mari veio falar comigo à sede do CNRT em Balide.

Ele disse-me que saíram porque estavam zangados comigo, porque eu deixei algumas pessoas falarem no Congresso rebaixando o nome da FRETILIN. Estas pessoas eram vítimas da violência política da FRETILIN no mato.

Eu respondi-lhe um pouco zangado: “Você esqueceu-se das três coisas que pedi na vossa Conferência em Maio. Limpar o nome das vítimas ou pedir desculpa ao Povo, não é rebaixar a FRETILIN mas concertar ou limpar o nome da FRETILIN”.

Eu disse-lhe também: “Você não tem razão para temer, porque o Sr. pode dizer ao Povo o seguinte: Eu, Mari, não tenho nenhuma razão para estar contente por causa das razões erradas que aconteceram dentro de Timor. Eu, Mari, em Maputo, sofrendo durante 14 anos, lavo as minhas mãos todos os dias com sabão. Eu, Mari, tenho as mãos limpas, se quiserem pedir, vão pedir a Xanana, as mãos dele é que estão sujas, as mãos dele é que estão ensanguentadas.”

Eu continuei a dizer: “Se o Sr. continuar a falar assim, eu aceito, e eu irei pedir desculpa ao Povo quando a FRETILIN tomar a decisão política acerca disso”.

No “Lapangan Pramuka”, agora designado “Campo da Democracia” todos os partidos políticos assinaram que iriam constituir um Governo de Unidade Nacional. Quando a FRETILIN ganhou afastou-se do compromisso político que aceitara. Se não queria aceitar, não necessitava de lá ir assinar, em vez de ir assinar e, no fim, virar as costas às palavras que tinham assumido.

Isto é tal e qual como na Constituição que eles fizeram, as leis que eles fizeram. Eles fizeram, viraram as costas, não cumpriram.

Povo que eu respeito
Membros da FRETILIN.

Todos sabemos e reconhecemos que a Fretilin saiu vitoriosa em Agosto de 2001. Se falarmos como deve ser, com o devido respeito pelos Partidos da oposição, a maioria FRETILIN foi quem fez a Constituição da RDTL, definindo o Estado de Direito Democrático.

Num Estado de Direito Democrático, de acordo com a Constituição, as Forças Armadas e a Polícia devem ser apartidárias, não devem defender nenhum partido. Mas, o que testemunhámos até hoje, é que a Policia está sob o controlo do Governo, e para dar de comer a mulher e filhos, não tem coragem para dizer ‘não’, quando recebe ordens do Ministro do Interior, e algumas vezes do próprio Primeiro-Ministro.

No passado dia 2 de Junho, antes da reunião do Conselho Superior de Defesa e Segurança, o Brigadeiro Taur falou comigo e disse: “Presidente, eu disse ao Dr. Roque Rodrigues, o vosso maior erro foi tentarem submeter as F-FDTL à FRETILIN.” Naquele momento fiquei muito contente porque reencontrei-me com o meu Irmão que eu tinha perdido.

Os Serviços de Informação ou Inteligência, que se tornou na Inteligência do Partido, para escutarem a conversa do Presidente em Lospalos, e enviar ‘sms’ imediatamente ao Primeiro-Ministro, monitorarem as actividades dos Partidos da oposição e também enviarem ‘sms’ para o Primeiro-Ministro. Alguns jovens no Farol também viram algumas coisas. Enviaram ‘sms’ para o Primeiro- Ministro. Hoje em dia, porque não há trabalho, todos nós procuramos sobreviver. Se tivermos dinheiro, aproximamo-nos deles.

Toda a gente vê que isso está a acontecer no nosso país.

Há pouco tempo, numa reunião em Baucau, algumas pessoas diziam assim: “Xanana, ‘assim mesmo’, na guerra dividiu-nos. Finda a guerra continua a dividir-nos”. Compreendo o sentido da palavra “fahe” [dividir]. O seu sentido, para os políticos e os intelectuais, correctamente, todo o Povo tem de entrar para a FRETILIN, Polícia, FDTL, funcionários, ‘bisnis’ [negócio], suco, aldeia, búfalos, formigas, árvores, ervas, todas as coisas têm de entrar para a FRETILIN. Timor-Leste é a FRETILIN, FRETILIN é Timor-Leste. Não pode existir outra coisa, não podem existir outras pessoas. É isso que explica ‘Xanana divide Timor’, por isso, ‘Xanana tem que sair’. Como se dissesse que eu quero governar nos próximos 50 anos.

Encontrei-me com alguns, em 1991, em Díli, que me deram os parabéns porque defini uma estratégia política correcta em 1986, com a criação do CNRM. Hoje, encontraram uma cadeira no Governo, esperando ser amanhã, ou depois, ministro, e dizendo novamente que eu divido o Povo. 



Querido Povo martirizado

Por isso mesmo, depois do Congresso da Fretilin, no passado mês de Maio, muitos ou alguns delegados receberam armas. Os Administradores de Distrito e subdistrito também ouviram dizer que alguns receberam armas. Por isso mesmo, vemos na televisão, ouvimos na rádio, lemos nos jornais, os políticos e os sábios que detêm o controlo desde a ponta do ‘kuda talin’ [as rédeas do cavalo], dizerem repetidamente que: ‘Se Mari sair, haverá derramamento de sangue!’, ‘Se Mari sair, Timor explode’, ‘Se Mari sair, haverá guerra!’.

Talvez o Comandante seja Rogério. Os Membros do Comité Central viram-se Conselheiros Políticos, para a ideologia de ‘Ran Nakfakar’ [derramamento de sangue] e para a ideologia de ‘Timor rahun’ [Timor vai explodir]. O Vice-Presidente do Parlamento também já gosta de falar de ‘guerra’. Já tem muito dinheiro então tem de falar de ‘guerra’.

A História continua a evoluir, continua em movimento, e são os actos de todos nós que escrevem a história. Eurico Guterres, que todo o mundo conhece, acusado de ser assassino e outras acusações, ficou preso, nós todos pronunciamos o nome dele e todos nós o acusamos porque em Timor-Leste somos todos santos, somos todos heróis da Libertação, somos todos políticos governantes. Com efeito, é muito interessante !!!

Enquanto Eurico Guterres, no dia 26 de Maio passado, enviou um ‘sms’ pedindo aos nossos governantes para não fazer este povo sofrer tanto, os nossos governantes, alegremente, falam de ‘ran sei nakfakar’ [haverá derramamento de sangue], ‘Timor sei rahun’ [Timor há-de explodir], ‘ita sei funu’ [nós vamos à guerra].

A História avança, silenciosamente, continua em movimento, registando os nossos actos, os bons e os maus, os limpos e os sujos.

Ninguém poderá inventar a história, somos nós mesmos que estamos a fazer a nossa história, uma história triste que nos envergonha, e faz com que o povo sofra.

Eles talvez continuem a contar com as Falintil-FDTL. Mas com a prática deles, sujaram também o bom nome das F-FDTL. E eu acredito que as Falintil-FDTL, hoje, aguardam por mim, para nós podermos conversar. As Falintil-FDTL também erraram, mas erraram porque deram ouvidos a pessoas mal intencionadas, deram ouvidos a pessoas que não amam o povo, deram ouvidos a pessoas que tentam comprar a alma do povo. Durante os tempos da guerra de resistência nós dizíamos sempre: se as balas não matarem, o arroz e o supermi podem matar, as balas só podem matar o corpo, mas as rupias, o arroz e o supermi matam até a própria alma.

Hei-de vestir a farda de novo para de novo erguer o bom nome das Falintil-FDTL. Hei-de caminhar de novo com as Falintil, porque é Aswain do Povo [é o brio do Povo], mas que hoje chora, estão arrependidos, por não quererem escutar o seu Irmão mais velho, e escutaram só os que têm sede de sangue. Em 2000 eu saí das FALINTIL porque reconheci que as FALINTIL já haviam cumprido a sua missão sagrada de libertar a Pátria, e todos os seus membros já são crescidos, o que me permite deixá-los sozinhos para continuar a sua própria caminhada. Tal como no CNRT, em 2001, decidimos dissolver, para que cada um procure o seu lugar nesta nova caminhada de nação independente.

Mas eu estou pronto para caminhar de novo com todos eles e pedir desculpa ao Povo. Depois disso, todas as F-FDTL, desde o Brigadeiro General até aos novos soldados, farão Juramento ao Povo, dizendo que, enquanto militares, curvam-se perante a Constituição, respeitam as Leis, e nunca dependerão de um Partido, e darão garantias de liberdade e segurança à população, e respeitarão a Ordem Constitucional.

Os que têm sede de sangue e tentaram dividir a PNTL e atiçá-los uns contra outros, também farão Juramento ao Povo, que só se submeterão à Constituição, que defenderão a legalidade democrática e darão garantias de segurança interna para todo o povo e não se submeterão a um partido.

No dia 11 de Maio, Mari disse-me que desconfiava que o Rogério estivesse por detrás do 28 de Abril, porque não cumpriu a ordem do Mari para enviar a UIR de imediato para impedir os manifestantes.

Duas semanas depois, Rogério foi a Caicoli falar comigo. Eu disse-lhe: “Rogério, para citar o nome de Nicolau Lobato, devo dizer-te que eu estive juntamente com Nicolau nalguns dos momentos mais difíceis da guerra. As pessoas acusam-te de distribuir armas. Acredita ao menos em mim. Pensa bem, porque na guerra eu não perdi nenhum membro da minha família, tu perdeste a tua família toda. Nicolau com todos os teus irmãos, estão a olhar para nós, estão a chorar por causa das coisas que estão a acontecer. Eu sei que eles não querem isto”.



Companheiros

A grande História dos que têm sede de sangue ainda é uma longa história. Porque, em todos os lugares, aparecerem pequenos comandantes espalhados por todo o Timor, fazendo barulho, para aterrorizar as pessoas. Algumas pessoas, talvez do Departamento de Comunicação do Comité Central, enviaram ‘sms’ para os delegados, para os administradores.

Mas, com a ânsia, marcaram mal o número e todos receberam o ‘sms’ pedindo para levar “10.000 pessoas desse distrito, 5.000 de outro distrito, para apoiar o camarada Lu-Olo e camarada Mari”.

Hoje, se queres ser funcionário, ou ministro, tens de te preparar para matar a tua própria alma, porque o dólar despiu os princípios que, porventura, ainda pudesse ter, nós não sabemos.

Vemos muito bem, estas pessoas brincam com o sofrimento do povo, usam o povo para defender a sua cadeira, o seu nome e o seu bolso.

No Relatório da CAVR pede-se o FIM DA VIOLÊNCIA POLÍTICA, para que o povo não sofra uma vez mais. Ainda recentemente, em Janeiro passado, fui entregar este Relatório ao Secretário-Geral da ONU. Ainda mal se completaram seis meses, disparos de armas, incêndios, pessoas mortas em Dili.

Um jovem em Lospalos, chamou-me traidor, porque não defendo um tribunal internacional. Hoje, ele não está sossegado, está todo envaidecido em Lospalos acreditando que a FRETILIN tem armas para fazer a guerra.

Eu fui a Lospalos no ano passado e falei com eles, e disse que a FRETILIN tem de pedir desculpa. Enviaram de imediato um ‘sms’ ao Mari. No meio de uma reunião, Mari mostrou-me esse ‘sms’ e parecia contente porque a sua rede de informações do partido está espalhada por todo o Timor para informar sobre as conversas do Presidente ou as actividades da oposição.

Pude dizer a este jovem, que eu, agora, não quero ser mais um traidor do Povo. Porquê? Quando o Tribunal iniciou os julgamentos de crimes que estão a ser cometidos pedi aos Tribunais para considerarem se podiam esvaziar as Prisões de Becora, Baucau e Ermera para receber os novos hóspedes. Neste momento, todos aqueles apenas cometeram crimes menores comparando com o que está a acontecer agora. Crime contra o estado de Direito Democrático, crime contra o Povo que já sofreu durante a guerra, durante 24 anos. Becora, Baucau e Ermera hão-de receber diversos hóspedes, muitos corruptos que hão-de lá ir e têm de ir para lá.

A Comissão Internacional de Investigação irá chegar, para nos ajudar a todos, para avaliar esta violência política que assolou o nosso país. Tudo quanto a CAVR fez e transmitiu, para escutar o choro do povo, o que o povo pede, as exigências do povo, para os políticos não fazerem sofrer mais o povo, para evitar a violência política, tudo isso, a liderança da FRETILIN não quis ouvir, ignorou. A liderança da FRETILIN demonstrou que, este choro, não lhes diz respeito, este chorar, não é problema deles, mesmo que o povo sofra não é problema deles, nem que o povo morra, não é problema deles. O grande problema para eles é como manter-se no Governo. A liderança da FRETILIN, por causa da sua arrogância, só sabe é acusar outras pessoas e não são capazes de reconhecer que também erram. Para eles, não há erros, porque o que fazem tem um objectivo: governar.

Só devem pensar em guerra para governar, porque governar dá-lhes tudo, dinheiro, boa casa noutro país, negócios que lhes dão dinheiro e ao partido também, mas o partido para eles é o pequeno grupo que está a governar. O Povo está a sofrer em Dili, não foram ainda ver o Povo, nem foram ainda falar com o Povo. Só se preocupam é em mobilizar pessoas do interior, para demonstrar que toda a FRETILIN curva-se perante eles, para lhes beijar as mãos e os pés. O Povo que se mobiliza para os apoiar, coitado, talvez andem de carro sem pagar, para gritar ‘Viva este, Viva aquele’, e depois de serem alimentados regressam às suas casas, continuam a cavar a terra, querem mandar os filhos para a escola mas não têm meios, sem dinheiro, em casa continuam com fome.

Na mensagem de Fim do Ano de 2005, eu apelei aos jovens e a todo o povo, para não darem ouvidos aos políticos que clamam pela ‘violência’, que os empurram para a violência. Nós não queremos ouvir-nos uns aos outros, todos confiamos que todos os sábios desta terra que, com as suas atitudes, podem dar-lhes dinheiro, para sujar a imagem da Fretilin, e para matar o nome e a história da FRETILIN.

Eu sei, que Nicolau Lobato está triste. Nicolau Lobato não pede que o seu nome seja colocado em todos os lugares. Ele não precisa. O que ele pede é apenas isto: que respeitem a sua luta para libertar esta Terra e este Povo, que respeitem apenas o seu sangue.

Espíritos e Antepassados, levantem-se para olhar por este povo! Ossos que estão espalhados por todos os cantos, ponham-se de pé, Sangue que foi vertido por todos os cantos, juntem-se de novo para ver aqueles que querem estragar o povo, que querem ver o povo sempre a sofrer, que querem ver o povo sempre a morrer.

Mostrem-se, mostrem a vossa força! O vosso filho está aqui, que vos implora, para olharem por este Povo, para libertar este Povo do jugo dos sedentos de sangue.



Povo sofredor

Membros da FRETILIN

Em política, quando nós erramos, mesmo sendo um pequeno erro, mas se não reconhecermos que é um erro, voltaremos a cometer muitos e maiores erros. Porque não se reconhece que entre 1975 e 1978, a FRETILIN matou membros da própria FRETILIN e outros que não aceitavam a sua ideologia, hoje em dia, para a liderança da FRETILIN, matar não é problema. Matar, para eles, uma pessoas ou duas, ou dez, ou centenas, ou milhares, é matar. O importante para eles é que o partido seja forte, para que governem sempre.

Um Partido assim, é um Partido que não quer a democracia, um partido que quer impor a sua vontade a todos nós.

Eu respeito a FRETILIN porque a FRETILIN me ensinou a amar a Terra e a servir o Povo.

Todo o Povo respeita a FRETILIN, porque a FRETILIN faz parte da História de Timor-Leste. Mas, o Povo tem de desprezar as pessoas que querem acabar com este Partido, para fazer todo o Povo sofrer.

Estas pessoas não merecem estar na FRETILIN. Penso que outros Partidos não os hão-de receber, porque estas pessoas querem sugar o sangue do Povo, querem ver o sofrimento do Povo, para poderem governar sempre, para estarem bem. O Partido que os acolher, o Povo tem de ter cuidado, porque este Partido talvez mais tarde tenha sede e peça o sangue do Povo.

Rogério deixou de ser ministro, Mari promoveu-o a Vice-Presidente da FRETILIN. Faz-nos sentir vergonha por esta política suja. Rogério foi ao Quartel da Polícia pedir combustível para o carro que ainda tem. O Responsável pela Logística da PNTL disse-lhe: o Sr. já não é Ministro do Interior, não pode receber combustível da PNTL. Rogério respondeu insultando-o: Macaco, eu agora sou mais do que Ministro, tu sabes ou não?

No dia 28 de Novembro de 2002, pedi para que ele fosse demitido, porque todas as informações diziam que, em vez de fazer o seu trabalho, organizava o povo, para cortar a lenha, para ele vender, plantar mandioca, para ele vender, fazer o vinho, que ele há-de vender, pescar, que ele há-de vender. Eu falei com o Mari, como Primeiro-Ministro e com o Ministro Horta, na minha casa, antes de 28 de Novembro de 2002, sobre o Rogério. Mais tarde, porque pedi para ele ser demitido, eu é que errei e quando aconteceu o 4 de Dezembro, apontaram-me o dedo.

Todos sabem sobre os buracos que foram cavados em Tibar, também noutros locais, porque Rogério andava à procura de ouro/tesouro, que ele ouviu dizer que os japoneses haviam enterrado. Nós não nos devemos admirar com as atitudes que o Rogério toma. Enquanto estávamos em guerra e sofríamos na nossa Terra, Rogério, enquanto ministro da Defesa, viveu em Angola e aproveitou para traficar diamantes até ser detido numa prisão. E a FRETILIN, por causa do seu nome Lobato, ou porque algumas pessoas se sentiram afectadas, elegeram-no como Vice-Presidente da FRETILIN.

Na tomada de posse do Ministro do Interior, apertei-lhe a mão e disse-lhe: “Rogério, não esperes que eu te respeite, só por teres o nome Lobato. Nicolau também era Lobato, mas era Nicolau, tu chamas-te Rogério. Respeitar-te-ei, se a tua atitude me revelar que mereces respeito, mas não é por seres Lobato”. Alguns investidores procuram encontrar-se comigo e disseram: “Presidente, o vosso sistema é muito diferente, para investir no vosso país, há duas vias: uma, temos de contactar a Agência de Investimento sob a tutela do Ministro Rogério, ou, a segunda, através de langsung (taxa indirecta) paga às altas entidades.

Empresários timorenses disseram com tristeza: Presidente, já tenho a licença para a minha empresa mas sofremos pressão para fazer entrar algum dinheiro na FRETILIN. Eu perguntei-lhe “querem que eu fale?”, e eles responderam “Irmão, nós esperamos muitos anos, perdemos muito dinheiro, deixa-nos recuperar o nosso dinheiro”.

Companheiros membros da FRETILIN

Querido Povo sofredor

Por isso, como Presidente da República, que não aceitou o resultado do Congresso realizado de 17 a 19 de Maio passado, exijo à Comissão Política Nacional da FRETILIN, que organize imediatamente um Congresso Extraordinário para, em conformidade com a Lei nº 3/2004, sobre os Partidos Políticos, eleger uma nova Direcção do Partido. Quando digo, em conformidade com a Lei, isso significa alterar a ‘votação de braço no ar’ dos Estatutos da FRETILIN, para que a eleição da nova Direcção, seja por voto directo e secreto. Dou um prazo de uma semana, para que este Congresso Extraordinário seja feito, porque a actual Direcção da FRETILIN é ilegítima.

O Presidente da FRETILIN, Lu-Olo, Vice-Presidente da FRETILIN, Rogério Lobato e o Secretário-Geral da FRETILIN, Dr. Mari Alkatiri, todos eles, de acordo a Lei dos Partidos Políticos, são ilegítimos.

Não se pode dizer que a FRETILIN não tem dinheiro, porque a FRETILIN tem muito dinheiro.

Até o dinheiro que sobrou do Congresso, Rogério comprou dois carros para o Grupo de Rai Lós.

Eu posso discutir a Crise com a Nova Direcção, mas cabe ao Estado decidir. Porque não é a FRETILIN que errou mas sim os que têm olhos grandes para o dinheiro e a enorme ambição para cavalgar sobre as costas do povo.

O que é o Estado de Direito democrático? O artigo 1º da Constituição afirma: “A República Democrática de Timor-Leste é um Estado de direito democrático ... baseado no respeito pela dignidade da pessoa humana”. Hoje em dia, nós falamos de ‘guerra’, de ‘derramamento de sangue’, e esquecemos a tolerância política. Os governantes demonstram que não têm respeito pela dignidade de cada pessoa, consentindo a violência e a destruição, causando mortes e perdas de bens.

O artigo 6º da Constituição afirma: “O Estado tem como objectivo fundamental: b) Garantir e promover os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos e o respeito pelos princípios do Estado de direito democrático; alínea c) defender e garantir a democracia política”. Nesta crise, só ouvimos ameaças de toda a ordem. Os governantes vão contribuindo para a violação destes objectivos do próprio Estado.

No artigo 29º da Constituição, afirma-se que: “nº 1 – A vida humana é inviolável; nº 2 – O Estado reconhece e garante o direito à vida”.

O que é que constatamos? Permite-se que as pessoas disparem umas contra as outras, pessoas são mortas, o povo sofre. Os governantes ajudam a violar a obrigação do Estado, não cumprem o seu dever de garantir a cada cidadão o direito à vida.

É a conjugação de tudo isto que dá sentido ao ‘Estado de direito democrático’.

O Povo agora enfrenta um problema muito sério: há armas nas mãos dos civis, há disparos de armas em muitos lugares. E também quero informar que as Forças de Intervenção apreenderam já muitas armas que não são da PNTL nem das F-FDTL.

O Estado não pode consentir isto, este sofrimento para o Povo. Algumas pessoas reclamam que ‘estamos a perder a nossa soberania’. Não é porque as Forças Internacionais tenham entrado na nossa terra, mas perdemos a nossa soberania porque nós é que fizemos o pedido e sobretudo porque nós é que demonstramos não ter capacidade para resolver os problemas surgidos, criando problemas ainda maiores.

O Estado de direito democrático não é só os órgãos de soberania estarem juntos, rirem-se uns com os outros, aparecerem na TV, dizerem aos jornais que nós estamos juntos. A Unidade Nacional não é encostarmo-nos uns aos outros para mostrar os nossos dentes ao povo. A Unidade Nacional, para ser consistente, tem de passar pelos nossos pensamentos e as nossas acções, tem de passar por ouvir a voz do nosso povo e ouvir os seus lamentos. Nós, os governantes, esquecemos sempre que: o povo pode sofrer, nós estamos bem, temos carros do Estado, temos casa do Estado, o povo sofre, continuamos a receber dinheiro, o povo passa fome, nós convidamo-nos uns aos outros para comer bem, beber vinho, o povo teme os tiros e nós andamos com uma forte segurança.

Por isso, não costumamos ouvir o lamento do povo porque estamos afastados de vós. O Povo está a sofrer, alguns têm a coragem de dizer “Guerra!”. Em vez de nós, os governantes, termos vergonha, mostramos que o sofrimento do povo não toca a nossa pele.

O Estado não pode consentir isto. O Estado não pode consentir que haja armas ilegais no nosso país. Acredito que a FRETILIN também não pode consentir todas estas coisas. Se a FRETILIN consentir, a FRETILIN quer fazer uma nova história neste querido país.

De quem é a responsabilidade? A justiça há-de determinar de quem é a responsabilidade! Todas estas coisas são muito graves! E é isso que hoje preocupa o Povo! E a própria FRETILIN tem de se preocupar com isso.

Por isso, APELO a todos que hoje ainda empunham armas, que as entreguem às Forças Internacionais e informem quem as distribuiu. Vocês não têm culpa, porque foram enganados por outras pessoas para se enterrarem. Se não entregarem essas armas, se as Forças Internacionais as encontrarem, isso significa que vocês querem guardar essas armas para matarem pessoas. Melhor, todos aqueles que receberam armas, vão entregar de imediato às Forças Internacionais. Não se esqueçam, têm de dizer quem as entregou a vós e para quê.

Já foi iniciado o Inquérito sobre a distribuição de armas a civis, assim como para saber que armas ilegais existem, de onde vieram e para quem, quem as pediu, quem as recebeu, quem na Alfândega as deixou sair. Todos os vossos nomes hão-de ser divulgados.

Aqueles que controlam a FRETILIN, ultimamente, gostam de gritar assim: vigilância máxima.

Agora, chegou o momento de eu pedir ao povo para fazer vigilância séria nos Distritos e Subdistritos, sobre aqueles que têm armas e distribuíram armas aos delegados ou a outras pessoas. Se sabem ou vêm pessoas com armas, mas que já as esconderam, informem as Forças Internacionais para eles as apreenderem, se estas pessoas não quiserem entregá-las. Se entregarem imediatamente, podem regressar a casa. Se forem teimosas, se escondem ou enterram as armas, hão-de responder perante o Tribunal, acerca da missão para a qual receberam a arma, e o motivo por que a esconderam, para matar quem.



Companheiros

Querido Povo sofredor


Acredito mesmo que nós todos já percebemos que temos de pensar no sofrimento do povo em primeiro lugar. Enquanto Presidente da República, quando me desloco ao estrangeiro, falo sempre da mesma forma: Timor, é mesmo um caso de sucesso, porém esse sucesso só durou até 20 de Maio de 2002.

O processo de governação do nosso país é que mostra se ainda temos sucesso ou ainda não.

Acredito que esta grande crise, não dá garantias de sobrevivência ao Estado de direito democrático, nós ainda vamos atravessar esta ribeira suja para erguer algo de novo no nosso país, para fazer florescer os direitos humanos, a democracia, o amor e a paz.



Membros da FRETILIN

Querido Povo sofredor


Pergunto ao Primeiro-Ministro se ele tem conhecimento sobre a distribuição de armas a alguns delegados da FRETILIN, e ele responde que não sabe. Mas, mais tarde, ele soube, e mandou o Rogério para desarmar. E o Rogério enviou um ‘sms’ para Rai Lós, para barrar o caminho dos manifestantes que estavam contra o Governo, para queimarem os carros à noite, fazerem as ‘operações comando’ e esconderem-se durante o dia.

Nas reuniões que tive com ele, o Primeiro-Ministro falou sobre os grupos armados, dizendo que têm de ser desarmados e nunca me foi dito que, pelo menos, o grupo de Rai Lós fora armado pelo Rogério.

O Primeiro-Ministro informou-me que, depois do tiroteio em Tasi Tolo, no dia 24 de Maio, no qual a FDTL capturou 4 armas da polícia, Rogério fez-lhe saber que as armas e as pessoas que morreram eram do grupo Rai Lós, lá colocado pelo próprio Rogério.

Na verdade, o Primeiro-Ministro informou o Brigadeiro Taur Matan Ruak acerca disto, que as armas da polícia não foram distribuídas pelo comando da polícia mas sim pelo Rogério. Eu penso que se o Primeiro-Ministro informou o Brigadeiro Taur, o Brigadeiro talvez não tenha chamado os civis para levarem as armas para Díli, com a FDTL, para procurar a polícia e matá-la.

Eu perguntei a ele, Primeiro-Ministro, se tinha conhecimento sobre armas ilegais que tivessem entrado no nosso país e ele respondeu que não sabia.

Todos os problemas que apareceram não são da sua responsabilidade. A conversa deles é a de empurrar sempre para os outros. Antes de ir a Portugal, pedi para resolverem o problema dos peticionários, dentro da própria instituição, isto é, dentro do quartel, para evitar que ‘lorosae loromonu’ explodisse para fora e estragasse a estabilidade e unidade nacionais.

Ele disse mesmo que o problema é um problema político e prometeu que ia fazer todos os possíveis para a sua resolução. Quando cheguei de Portugal, na internet foi divulgado que o Primeiro-Ministro afirmou que ‘não pode resolver, porque a petição não foi dirigida a ele’, para apoiar uma decisão para a saída dos peticionários.

Porém, no dia em que começou a manifestação dos peticionários, Antoninho Bianco leu um comunicado: ‘agora, o Primeiro-Ministro já pode resolver porque, pela primeira vez, oficialmente, recebeu a petição’.

Todos os problemas que apareceram, que outras pessoas provocaram, que outras pessoas queriam, são para estragar a sua imagem, para baixar a [votação da] FRETILIN nas eleições de 2007.

Como os governantes, nos órgãos de soberania sentem e mostram que os problemas que surgiram não são da sua responsabilidade, eu digo a todo Povo e à FRETILIN.

Todos temem que, se Mari sair, a guerra regressa e há derramamento de sangue novamente.
Muitos estão preocupados que, se Mari cair, o Governo não funcione, as pessoas não recebam dinheiro e outras coisas. Também, se Mari cair, toda a bancada da maioria demite-se e o Parlamento deixa de funcionar.

Alguns dizem-me que temos de mostrar à Comunidade Internacional que existe uma normalidade institucional ou constitucional, senão é uma grande vergonha, se o trabalho das instituições for interrompido.

O Povo é que me escolheu. Como fui eleito, tenho de prestar contas ao Povo. Antes, de procurar satisfazer a comunidade internacional, eu tenho de curvar-me perante o Povo, sofredor, que me escolheu. O Povo pergunta-me, enquanto Presidente da República, onde está a minha responsabilidade quanto ao ‘garante da Unidade Nacional’ que se fragmentou, ‘garante da estabilidade’ que se desintegrou e ‘garante do funcionamento normal das instituições democráticas’ que paralisaram.

Como Presidente da República eleito pelo Povo, não pelo braço no ar mas por voto directo e secreto, eu tenho mesmo vergonha, porque eu não agarrei bem a minha responsabilidade. Por isso, estou pronto para assumir esta responsabilidade.

O Presidente da República é um órgão de soberania. Uma só pessoa, eu sozinho, sou o Órgão de Soberania.

Em conformidade com a Constituição, se o Presidente da República se demitir, o Presidente do Parlamento, Lu-Olo, assume o cargo de Presidente da República, promulga as leis para melhor as poder violar.

Tudo pode continuar a funcionar. O Governo continua a governar para tapar todos os buracos na cidade de Díli e também o Parlamento pode continuar a levantar o braço, para alimentar a mulher e os filhos. No Parlamento, não existem problemas: Jacob Fernandes não há-de pensar em guerra porque passa a ser o Presidente do Parlamento.

Uma coisa muito importante: este servo nunca há-de dizer que se for destituído, o povo há-de sofrer e que Timor fica arrasado. Por isso, a estabilidade continua forte e eu acredito que se os órgãos de soberania estiverem unidos, Timor avançará.

Assim, a FRETILIN é que escolhe. Não é a Direcção da FRETILIN, que é ilegítima porque viola a Lei e a Constituição.

Ou pedem responsabilidade ao vosso camarada Mari Alkatiri sobre esta grande Crise, sobre a sobrevivência do Estado de direito democrático ou, amanhã, eu próprio envio uma carta ao Parlamento nacional a informar que me demito de presidente da República porque tenho vergonha pelo que o Estado está a fazer ao povo e eu não tenho coragem para enfrentar o povo.

Finalmente, apelo à calma de todos porque neste momento difícil temos de reflectir profundamente para que esta violência e destruição não se repita no nosso país!


terça-feira, 28 de novembro de 2006

A Teoria das conspirações I (continua) por Xanana Gusmão


A teoria das conspirações

I

Hoje, o Timor-Leste livre e independente, é um espaço territorial onde as pessoas vivem ou com medo, ou com desconfianças ou com acusações.

A sociedade tornou-se ela mesma o veículo célere das informações deturpadas, dos rumores que se criam, das cartas anónimas que agradam tanto a muitas pessoas, que consideram isso tudo como a arma da propaganda (que, por acasos do destino,) aparecem sempre em sua defesa.

Nesta República Democrática, as pessoas supostamente idóneas já não dão a cara, porque fazem tudo no obscuro dos engendros tecnológicos, produzindo o maná que sòmente sacia a sua vontade irreprimível de se satisfazer ou de satisfazer quem pode garantir o espaço... de dignidade, que não encontrariam em outros espaços ou condições.

A moral deixou-se subjugar pelo insaciável desejo de retêr os benefícios pessoais, em nome da história e de outros incongruentes argumentos.

A nossa sociedade tornou-se uma sociedade mórbida, uma sociedade em que os sorrisos são falsos e em que o pensamento é orientado para a promiscuidade dos interesses muito mesquinhos.

A nossa sociedade tornou-se uma sociedade amorfa de sentimentos, porque os sentimentos deixaram de ser humanistas, para serem medidos pelo dinheiro.

Ultimamente, elites intelectuais e políticos tentam entreter-nos com teorias de conspiração.

No mundo moderno, assistimos também a muitas teorias de conspiração, inventadas por governos e países, que tentam iludir a consciência dos seus cidadãos, no intuito de legitimar as acções perversas que esses governos e países cometem em relação aos seus próprios cidadãos e em relação a cidadãos de outros países.

As teorias de conspiração nascem sobretudo de cérebros que não produzem, desses cérebros que só pensam e pensam mal, porque pensam que o que pensam é uma ciência incontornável.

As teorias de conspiração ganham a sensação de ‘verdade’ para essas pessoas que vivem o tempo, formulando essas teorias, porque essas teorias ficaram a ser a realidade diária do seu pensar.

Por outro lado, há pessoas que gostam de apresentar teorias de conspiração para poderem aparecer como as vítimas injustas... dos seus próprios actos.

Essas pessoas, normalmente, padecem de uma enorme falta de segurança. Sofrem a paranóia de que são perseguidas. As teorias de conspiração que tecem à sua volta, são uma forma de se sentirem seguros, na sua própria consciência ou, em melhores palavras, no seu ‘ego’, porque repelem toda e qualquer ideia ou possibilidade de erro.

Essas pessoas, afinal das contas, têm medo de si mesmas, têm medo da conclusão que as suas consciências possam dizer que erraram.

Assim as teorias de conspiração ilibam-nas de qualquer sentimento de culpa.

Mas o pior de tudo isso, é que os seus seguidores se tornam os melhores agentes de uma rede que montaram para impôr, ao mundo, essa teoria de conspiração. Tem os seus porta-vozes espalhados em muitos países, como a Austrália e Portugal. Esses seus representantes puderam sair do ostracismo, em que se encontravam, e hoje revelam-se fulgurantes máquinas de informação e de propaganda... da conspiração.

E fazem tudo – aproveitam a inventar histórias, aproveitam a distribuir as cartas anónimas (que eles próprios produzem), aproveitam a acusar outras pessoas. Em suma, passaram a uma orquestrada ofensiva... em sua própria defesa!


II

Todos pudemos ter acesso ao documento intitulado ‘Análise da situação e perspectivas’, feito pelo Comité Central da Fretilin, de 29 de Outubro findo.

Como Presidente da República, apesar de não me surpreender, devo dizer que me perturba o teor político da análise que o CCF emitiu:

‘I. A crise, as suas causas e desenvolvimento

A crise vivida em Timor-Leste radica-se, essencialmente, num conflito de natureza política onde o desrespeito pela ordem constitucional democrática e os meios e formas de agir reflectem o carácter profundamente anti-democrático e golpista.’

Desta lindíssima frase, podemos tirar duas peças importantes que sugerem a total falta de honestidade política e representam um insulto às mentes comuns de cidadãos comuns:

a. ‘desrespeito pela ordem constitucional democrática’
b. ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’

O documento enumera vários acontecimentos que o Comité Central da Fretilin considerou reflectirem a natureza e o carácter de uma conspiração que veio apresentando as mais diversas facetas.

O CCF teve o cuidado de juntar diferentes peças para fazer um carro e isso lembra o caso da Oficina dos Veteranos, em Taibesse, onde entrava um Land Cruiser e saia um Tata. (O malasiano que trabalhava ali, em sociedade com respeitadas pessoas, estragou o nome e a credibilidade da oficina, tendo partilhado com os seus sócios centenas de milhares de dólares... e foi ajudado a fugir, para ilibar os seus sócios. Quem pagou com aquilo tudo, foram os pobres veteranos da oficina.)

E o documento continua assim:

‘As acções para pôr em causa a ordem constitucional reuniram actores internos e externos e passaram por diferentes etapas e tomaram as mais diversas formas’. ( O tracejado é meu!)


1. O primeiro argumento é sobre uma ‘tentativa de forçar a criação de um Governo de Unidade Nacional em 2002’.

Quando se utiliza a palavra ‘forçar’, quer-se dar a ideia de ‘uso de força’ ou, no mínimo, ‘uma pressão política de tal ordem que inviabilizou, mesmo momentâneamente, um determinado processo’.

O ‘Lapanggan Pramuka’ denominou-se ‘Campo de Democracia’ por um evento (agora, sim, percebemos que foi totalmente anti-democrático) que reuniu todos os partidos políticos da altura, concorrentes às eleições para a Assembleia Constituinte. Eu disse atrás ‘reuniu’ e queria dizer juntou, fez aparecer juntos no evento.

Ninguém, quanto a mim, forçou ou obrigou a Fretilin a tomar parte do evento. (Devo dizer que foi essa a minha percepção, naquela altura, já que eu estava totalmente fora do processo político em Timor, sendo um cidadão ordinário, totalmente livre de estatutos e privilégios).

Ao que eu sabia, na altura, foi que:
  • considerando-se que o factor da Unidade Nacional foi crucial nos tempos difíceis da Resistência,
  • considerando-se também a pouca firmeza do espírito democrático da população em geral, ainda com os ressentimentos provocados pela violência e destruição de Setembro de 1999,
  • considerando-se que a ruptura feita pela Fretilin com o CNRT, em Agosto de 2000, tornava o processo democrático bastante frágil e
  • considerando-se que essa fragilidade democrática foi tantas vezes posta à prova em todo o 2000 e 2001,

Se tornava necessário que os Partidos se juntassem num esforço de apelo e compromisso à Unidade Nacional, assinando eles todos o Pacto de Unidade Nacional.

A Fretilin participou e assinou o documento e eu acredito sinceramente, ninguém forçou, ninguém obrigou nem ninguém ameaçou de morte os históricos líderes da Fretilin.

Foi esse documento que, posteriormente, partidos e pessoas utilizaram para mencionar esse tal Governo de Unidade Nacional. Mas o facto de as pessoas criticarem e mencionarem o Pacto de Unidade Nacional, como argumento para as suas ideias, pode ser já considerado que reflecte um ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’?

A Constituição foi aprovada, com a Fretilin detendo a maioria absoluta, na Assembleia Constituinte (onde os deputados eram também o Dr. Mari Alkatiri, a Dra. Ana Pessoa, o Dr. José Reis, o Dr. José Manuel Fernandes e outros tantos distintos).

A Constituição garante, no seu artigo 40.º, a liberdade de expressão e de opinião e, afirma expressamente, essa liberdade ‘não pode ser limitada por qualquer tipo de censura’.


2. O segundo argumento é de que houve uma ‘pressão política a favor de novas eleições em 2002’.

Fui um dos defensores desta ideia e por uma razão muito simples! As eleições de Agosto de 2001, foram para o quadro de uma Assembleia Constituinte. Assistimos a um processo muito democrático de campanhas, contudo todos os partidos fizeram as suas campanhas centrando na elaboração de uma Constituição para a República.

Nenhum Partido apresentou, na altura, um programa político de governo ao eleitorado, ao Povo. No início, como estávamos e estamos, de exercício de soberania, o povo tem que ser educado a eleger os seus representantes pelos programas que os partidos apresentam.

Defender esta ideia, expressar esta ideia em voz alta, é já fazer ‘pressão política’? Como disse atrás, ‘pressão política’ só pode ser percebida se houve ‘acções que, mesmo que momentaneamente, tivessem inviabilizado um processo’. E não houve!

Se, falar para se expressar uma ideia, é já pressão política, a Constituição não tem valor! E a CPD-RDTL tinha razão: a restauração da independência (proclamada em 28Nov75) devia restaurar tudo, a começar pela Constituição da RDTL de 1975! E restaurava-se também o I Presidente da República, Francisco Xavier do Amaral!

Mas, onde é que este país vai parar se todos temos que nos curvar aos desejos supremos de um Partido de maioria no poder? Onde é que este país vai parar, se os interesses do Partido da maioria devem sempre prevalecer?

E verdade seja dita, esses interesses têm prevalecido: a mudança automática da Assembleia Constituinte para o Parlamento Nacional, é um facto! Reclamou-se, mas a mudança foi sempre respeitada! Pode-se enumerar as incontáveis vezes em que os interesses da maioria sempre prevaleceram! Ninguém se vai esquecer da célebre frase: ‘não vamos mudar nem um ponto nem uma virgula’!

Com todo este poder para fazer prevalecer os seus interesses, vem o CCF (do Congresso de Maio de 2006) afirmar que houve pressão política para novas eleições em 2002 e que isso constitui um ‘desrespeito pela ordem constitucional democrática’? E o facto de se defender esta ideia, reflecte um ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’?

Por amor de Deus, Senhores Doutores!

Quem tem culpa agora? Não terá sido a maioria da Fretilin na Assembleia Constituinte, que redigiu uma Constituição democrática, mas com premissas ideológicas diferentes? Ou é, realmente, essa teoria de uma conspiração bem urdida de golpe, com envolvimento de actores internos e externos?


3. O terceiro argumento apresenta ‘a tentativa de derrube do Governo a 4 de Dezembro de 2002’.

Esta afirmação só revela a hipocrisia política do Comité Central da Fretilin, democratica e transparentemente eleito no Congresso de Maio de 2006!

Quem estabeleceu uma Comissão de Investigação sobre o 4 de Dezembro de 2002? Não foi o Governo? O tal I Governo constitucional da República Democrática de Timor-Leste, eleito democráticamente nas eleições para a Assembleia Constituinte, em Agosto de 2001? O Governo do Senhor Dr. Mari Alkatiri, da Senhora Dra. Ana Pessoa, do Sr. Lu Olo, para todos se lembrarem que era o Governo da Fretilin?

Porquê, passados 4 anos, nenhum relatório saíu ao público sobre o 4 de Dezembro? Porque o Governo do Senhor Dr. Mari Alkatiri e da Senhora Dra. Ana Pessoa, não revelou o que a Comissão terá achado, de todo o acontecimento de 4 de Dezembro?

Não será que houve já indicações do envolvimento de ‘actores internos e externos’ para um golpe? E porque não foi revelado? E, muito importante, quem foram, quem eram esses actores?

O que está registado na mente das pessoas é que o problema começou com a actuação da polícia, na Escola Primária ’28 de Novembro’, gerida por professores pertencentes à CPD-RDTL. No dia seguinte, houve a tal manifestação, à frente do Parlamento Nacional, e o possível envolvimento conflituoso de membros do Governo e deputados. Mais nada se sabe, porque toda a gente ficou à espera do resultado da investigação, que ainda não apareceu.

Não, não se aceita nem se pode admitir que, 4 anos depois, o Comité Central da Fretilin (do Congresso de Maio de 2006) venha a dizer que foi uma tentativa de derrube do Governo, sem mencionar os mínimos dados sobre a investigação realizada, depois do 4 de Dezembro de 2002!

Por favor, Senhores Doutores, sejamos honestos! Este é tipo de contra-informação que o povo já conhece, desde os tempos da ocupação indonésia. E foram 24 anos de vivência com o sistema de informação e contra-informação promovido pelo regime, Senhores Doutores! Alguns vossos camaradas, membros do Comité Central da Fretilin, sabem que nós sabemos que eles sabem ... dessa experiência, que vós estais a aplicar!


4. O quarto argumento refere às ‘manifestações públicas durante o ano de 2003 usando diferentes franjas da população’.

Tentei lembrar-me das manifestações que houve em todo o ano de 2003 e só consegui lembrar-me de duas, possivelmente em 2003, mas podem ser de 2004. Uma, lembro-me com clareza, porque me pediram para lá ir falar, foi organizada pela CPD-RDTL. Na altura, o Primeiro-Ministro estava em Darwin. Falaram sobre o problema de ‘antigos combatentes’ e outras discordâncias em relação à Constituição, porque a CPD-RDTL sempre defendeu a Constituição de 1975.

Uma outra, foi promovida por condutores de taxi, de ‘anggunan’ e de ‘mikrolet’, exigindo a redução do preço do combustível.

Não consegui lembrar-me de outras que tenha havido.

O Comité Central da Fretilin (do Congresso de Maio de 2006) está a afirmar que, na República Democrática de Timor-Leste, não deve haver manifestações contra o Governo! Porque isso só revela o ‘desrespeito pela ordem constitucional democrática’ e reflecte ‘o carácter profundamente anti-democrático e golpista’!!!

Quem tem a culpa? Não é a bancada da maioria da Fretilin na Assembleia Constituinte, (onde estavam também o Sr. Dr. Mari Alkatiri e a Sra. Dra. Ana Pessoa), que redigiu a ‘imundície da democracia’ (as palavras não são minhas) na Constituição da RDTL, a qual, no seu artigo 42.º, garante a liberdade de reunião e manifestação?

O actual Comité Central da Fretilin deve admitir que foram os Senhores Doutores da Fretilin que deram margem constitucional para as pessoas pensarem e agirem com o ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’, porque se lhes deu liberdade para isso. E as pessoas aproveitaram-se, ‘usando diferentes franjas da população’ para manifestações de ‘carácter... golpista’!

O verbo usar pede um sujeito... objectivo! A pergunta é: quem, objectivamente, ‘usou’ ou estava ‘usando’? Quem, objectivamente, são os actores internos e quem, objectivamente, os actores externos?

Porque o Comité Central da Fretilin não mencionou a identidade dos ‘actores’, para se provar com clareza as intenções ‘golpistas’, o que se pode dizer é que o documento é uma análise objectiva das próprias maquinações políticas do CCF!


5. O quinto argumento é sobre uma ‘tentativa de manipulação política dos problemas dos veteranos com a organização de uma manifestação com o ex-comandante L7 e outros veteranos em 2004’.

A linguagem política utilizada pelo Comité Central da Fretilin é que é, na verdade, uma manipulação política dos factos.

Quando o Comité Central da Fretilin escreve: ‘com a organização de uma manifestação com o ex-comandante L-7 e outros veteranos’, o CCF pretende dizer que alguém organizou a manifestação e, portanto, o L-7 foi utilizado, foi instrumentalizado.

Em primeiro lugar, devo dizer que o Comité Central da Fretilin (do Congresso de Maio de 2006), tomou as consequências como a causa, invertendo propositadamente os problemas. O CCF tomou a manifestação como um facto de ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’ e não considerou os ou todos os antecedentes que provocaram a manifestação.

O Comité Central da Fretilin, talvez porque tenha muitos elementos novos ou porque tenha ainda muitos elementos antigos, esqueceu-se do acontecimento de Fatu Naba, onde a polícia revistou o carro do L-7, (sob a suspeita de levar armas, porque havia informações, na polícia, de que L-7 ia distribuir armas em Same, mas ele tinha ido para lá para assistir a um casamento) e retirou-lhe o carro, entregue pelo Governo para umas actividades, que nunca foram executadas.

O Comité Central da Fretilin descurou-se de ver que a acumulação de problemas (pequenos, na maioria) entre a polícia e veteranos e entre a polícia e elementos das F-FDTL, ficou agudizada com o incidente de Fatu Naba.

Que eu me lembre, o próprio Primeiro-Ministro me disse ter visto um encontro entre o ex-comandante L-7 e o Presidente do PSD, no City Café. Chegou o momento preciso para que o CCF aclare isto tudo, de vez. Que eu concorde que tivesse havido um aproveitamento político desse problema, com a inclusão de um caixão na manifestação, é uma coisa! Mas ‘manipulação política’, é o que o CCF está a fazer!


6. O sexto argumento refere-se à ‘manifestação organizada pela hierarquia da Igreja Católica em 2005’.

O Comité Central da Fretilin sofre de uma miopia política de análise que impressiona. O CCF tem um comportamento de cágado que esconde a cabeça em defesa de supostos ataques, pela aproximação de pessoas ou animais, e que não tira a cabeça da carcaça mesmo que as pessoas ou animais estejam já à distância, só por causa da sensação ou do medo de algum (suposto) ataque.

O CCF só sabe olhar para os actos de outros, para ver se descobre se o seu Governo é alvo de críticas e encobre os actos do seu Governo.

Agora, se pode perceber que, para o CCF, se há elogios ao Governo, existe o respeito pela ordem constitucional democrática. Se há críticas, existe o ‘desrespeito pela ordem constitucional democrática’.

Agora também se pode compreender que se há concentrações organizadas pela Fretilin, há o respeito pela ordem constitucional democrática e se há manifestações contra o Governo, existe o ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’.

Estou a gostar imenso da expressão ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’, expressão que revela a suma sapiência de doutores formados em países democráticos, durante 24 anos, enquanto o povo resistia, sem doutores, para ganhar a guerra!

O actual CCF esqueceu-se de averiguar junto do seu camarada Secretário-Geral, reeleito no Congresso de Maio de 2006, se o Presidente da República não sugeriu, alguma vez, e não insistia, por mais de uma vez, ao então Primeiro-Ministro do I Governo Constitucional, eleito democraticamente, nas eleições para a Assembleia Constituinte, em Agosto de 2001, para, de quando em quando, ter reuniões com os dois Bispos e se o então Primeiro-Ministro do I Governo Constitucional, eleito democraticamente em Agosto de 2001, nas eleições para a Assembleia Constituinte, prometeu fazê-lo e nunca fez.

O mesmo se pode dizer em relação aos Partidos políticos da oposição, como necessidade de trocar impressões, de informar sobre as políticas do Governo, aliviando-se assim as tensões já existentes.

Eu agora posso acreditar que o Senhor Dr. Mari Alkatiri irá informar, a pés juntos, ao distinto Comité Central da Fretilin que isso tudo não e nunca aconteceu!

O que se pretendia com essas sugestões (imbecis) do Presidente da República?

Sujeitar os supremos interesses do governo e da maioria parlamentar à Igreja e aos partidos da oposição? Ou, reduzir as tensões e abrir caminho para alternativas ou opções na solução de problemas ou, no mínimo, a mútua e franca aceitação de diferendos?

Prove-se o que se queira provar, mas ponham-se os factos com clareza!

Terá havido actores internos, na manifestação da igreja? Seriam os dois Bispos! Seriam apenas eles ou também o Sr. Pe. Filomeno Jacob e a Sra. Fernanda Borges? Será que o Pe. Filomeno Jacob e a Sra. Fernanda Borges abordaram as F-FDTL no sentido de actuarem num golpe?

Ponham as cartas na mesa, Senhores Doutores do CCF, do Congresso de Maio de 2006!

Terá havido actores externos? O Núncio Apostólico, da altura, fez uma homilia, que mereceu a crítica de todos! E todos sabemos a decisão que o Vaticano tomou! Terá sido o ex-embaixador americano Rees, que foi visto e fotografado junto dos manifestantes? Então que se prove a intenção do golpe!

O Povo não pode continuar a viver sob o fantasma do golpe!


7. O sétimo argumento é ‘a manifestação dos peticionários em Abril de 2006’.

Mais uma vez o Comité Central da Fretilin revela uma fantástica capacidade de distorcer os factos a seu favor, para se colocar como a vítima mais sofredora da crise, o que reflecte o grau e a intensidade dos valores que os seus membros absorvem.

Mais uma vez, os distintos membros do CCF, eleitos legitimamente no Congresso de Maio de 2006, confundem uma consequência com a sua causa.

Acredito que haja membros do CCF novatos e que desconhecem alguns factos, mas admira-me que um Senhor Dr. José Manuel Fernandes, (que foi Vice-Presidente de uma Comissão de investigação, em 2004), um Senhor Dr. Roque Rodrigues (que foi membro dessa Comissão, como representante do Governo, sendo ainda Secretário de Estado de Defesa), uma Senhora Dra. Ana Pessoa (Presidente da Comissão dos Notáveis), um Senhor Lu Olo (Presidente do Parlamento Nacional que recebeu o Relatório da Comissão de 2004) e o Senhor Dr. Mari Alkatiri, não se lembraram de que uma Comissão dos Órgãos de Soberania fez uma investigação à instituição das F-FDTL e apresentou uma série de recomendações ao I Governo constitucional, eleito democraticamente nas eleições para a Assembleia Constituinte, em Agosto de 2001.

Eu acredito que o CCF teria perguntado ao seu Governo se as suas instituições competentes (ou incompetentes) fizeram algum progresso na resposta a alguns problemas de fundo, detectados nas F-FDTL.

A Comissão apresentou o seu Relatório em Agosto de 2004 e fez as recomendações com um único objectivo: ajudar a instituição que, no fim das contas, pertence a todos, pertence ao Estado, pertence ao povo, (e não pertence à Fretilin) a resolver os vários problemas que enfrentavam, como um apoio fundamental à sua constante melhoria e profissionalismo.

O CCF não teve em conta que a expulsão em 2005, de 42 membros das F-FDTL, foi pelo não cumprimento da recomendação relativa ao sistema de pagamento de salários, que devia ser directamente aos familiares dos militares, com incidência aos que viviam na parte ocidental do país.

Eu tenho a certeza de que Presidente do Partido, o Sr. Lu Olo, foi mal informado pelo membro do CCF e ex-Ministro de Defesa, de que fora eu que estabelecera uma Comissão, depois da 1.ª saída dos peticionários. O que fiz, foi pedir aos dois distintos deputados, Sr. Gregório Saldanha e Sr. Paulo Assis, como membros do Conselho Superior de Defesa e Segurança, para serem observadores do processo de investigação que uma Comissão interna, liderada pelo Major Koliati, iria fazer. Foi o membro do CCF, o Senhor Dr. Roque Rodrigues, quem não concordou com a minha ideia de os dois distintos deputados encabeçarem uma Comissão, porque, segundo ele, ‘retiraria a autoridade do comando’.

Eu acredito que o membro do CCF, Sr. Dr. Roque Rodrigues, não informou o CCF, correctamente e em detalhe, da reunião de cerca de três horas e meia, que tive com esse Senhor, enquanto Ministro de Defesa, e o Coronel Lere, na presença dos dois distintos deputados, um dos quais, penso que é também membro do CCF.

Eu tenho a absoluta certeza de que o CCF não sabe que o Presidente da República fez tudo o que estava ao seu alcance para gerir correctamente o problema, tendo permanecido até mais da meia-noite, com o coronel Lere, para persuadir os peticionários a regressar aos quartéis.

A questão que se colocava, era: a solução de os expulsar, ali mesmo, era muito fácil! E lembrava-me do TNI dizer: se um soldado indonésio é morto, pelas Falintil, virão cem em sua substituição! Quando se pensa em termos numéricos, a solução mais fácil que se apresentava era de dizer-lhes, na cara: vão embora para casa! Acabou a festa!

Como Chefe do Estado, eu não deveria ser tão simplista neste raciocínio! Porque fui o Presidente de uma Comissão dos Órgãos de Soberania, em 2004, depois dos acontecimentos de Lospalos, cujos resultados nos recomendaram uma maior atenção às nossas Forças, para as não deixar cair no abismo da nossa falta de preocupação! Porque eu tinha informado, no ano passado, ao Conselho Superior de Defesa e Segurança, da insatisfação havida no seio das forças e que ameaçava o desmoronamento parcial daquela Instituição. Como Chefe do Estado, eu deveria esgotar todas as possibilidades de solução, antes de se tomar uma decisão drástica, como a de expulsá-los tão pura e simplesmente.

Eu tenho a certeza de que o CCF não analisou, com a isenção que o assunto merece, a situação que decorreu em Metinaro, após o regresso dos peticionários. Digo ‘com isenção’, porque a questão que se colocava não era a de ‘defender os peticionários’ ou ‘apoiar os peticionários’, mas ‘prestar o melhor apoio às F-FDTL no sentido de gerir com maturidade, que era exigida, os seus problemas internos’.

O Presidente do Partido, Senhor Lu Olo, não se lembrou de informar ao CCF que houve no Parlamento Nacional, por parte de partidos, pedidos para agendar apenas a discussão do problema, que pediria talvez uma intervenção do Parlamento Nacional, para se encontrar uma solução justa e equilibrada. Eu acredito que o Senhor Presidente do Partido histórico não fez isso, isto é, não informou ao CCF, porque seria reconhecer que ele nunca fez caso a esses pedidos e reconheceria também que os distintos membros do CCF, no Parlamento Nacional, defendiam que o PN não deveria interferir em assuntos puramente militares e disciplinares das Forças.

A Lei Orgânica das Falintil-FDTL, no seu artigo 8.º, diz que ‘os Órgãos do Estado directamente responsáveis pelas Falintil-FDTL, são os seguintes:

a. Presidente da República
b. Parlamento Nacional
c. Governo
d. Chefe do Estado-Maior General das Falintil-FDTL’.

Os Senhores doutores do CCF, membros do Parlamento Nacional, ainda se devem lembrar da recente cerimónia de Abertura da última Sessão Legislativa, onde deputados de diferentes bancadas lembraram que tanto a bancada da maioria sempre rejeitou como o próprio Presidente do Parlamento nunca agendou os pedidos para que o Parlamento Nacional debruçasse sobre o assunto das Forças, que são uma instituição do Estado e que merece todo o apoio necessário.

Apoiar não significa, com certeza, satisfazer ou agradar! Apoiar significa ajudar a resolver o/s problema/s que a instituição, por si mesma, talvez não fosse capaz. Quando apoiar tem já o sentido de passar uma esponja por possíveis erros cometidos pela instituição, o verdadeiro resultado é ‘estragar, desmoronar, enterrar’ essa instituição.

E foi isso que aconteceu, por parte da Fretilin, por parte do Governo e por parte da bancada da maioria no Parlamento!

O Secretário-Geral do Partido afirmou em várias ocasiões que as F-FDTL estavam mais ‘vinculadas’ ao Presidente da República! Eu não sei se ele disse isso por sarcasmo ou por ingenuidade!

O Presidente da República só foi em visita de trabalho aos quartéis, durante o processo de investigação, em 2004 e só teve ainda uma primeira visita oficial, como Comandante Supremo (pela Constituição), ao Quartel-General em Tasi Tolu, nos finais de 2005.

Sendo o Ministro de Defesa um membro do CCF, que viveu 5 anos sem interrupção, em casa do Comandante das Forças, é impressionante que se diga que as F-FDTL estavam mais ‘vinculadas’ ao Presidente da República. Sendo o Comandante das Forças convidado a participar em reuniões do Conselho de Ministros e outras reuniões de defesa e segurança com o Primeiro-Ministro, é preciso ter-se uma grande dose de humor para se dizer que o Presidente da República podia manter um vínculo com as F-FDTL. É preciso lembrar-se que, a partir de Fevereiro de 2001, o ex-comandante das Falintil se desvinculou totalmente das Forças, tendo-se integrado no programa da FRAP, do Banco Mundial, e recebeu também os 500 dólares americanos para a sua própria reinserção na sociedade.

Enfim, este país está entregue às magníficas análises políticas dos ilustres doutores do CCF!

Mas não ficou tudo dito! Porque é necessário dizer ao CCF que, no caso da manifestação dos peticionários, tomaram-se as consequências (da má política de gestão dos problemas) como a causa. E que causa! Prova de conspiração e tentativa de golpe, causa ‘do caos e da ingovernabilidade’ do I Governo Constitucional, democraticamente eleito nas eleições para a Assembleia Constituinte, em Agosto de 2001!

Eu penso que o Secretário-Geral do Partido não informou ao CCF de, pelo menos, uma questão que eu acho crucial no problema.

Eu não nego que o Governo se esforçou, no que pôde, para resolver o problema dos peticionários. Antes de ir a Portugal, em Março, para a tomada de posse do Presidente Cavaco Silva, reuni-me com o Primeiro-Ministro e tentando explicar que o termo Lorosa’e-Loromonu era uma capa que se estava a apresentar para encobrir os problemas internos na instituição das forças e que devia ser resolvido, solicitei os seus bons ofícios, já que, se isso continuasse, poderia trazer graves consequências para a estabilidade nacional com impacto muito negativo para a Unidade Nacional.

O Primeiro Ministro agradeceu-me a ‘confiança política depositada’ e prometeu fazer tudo ao seu alcance para encontrar a melhor solução. Parti confiante para Portugal, já que a minha vontade era de permanecer no país, para também ajudar a encontrar uma solução justa e equilibrada.

Já em Lisboa, soube pela Internet, que o Primeiro Ministro teria declarado que ‘não podia resolver o problema, porque a petição não tinha sido dirigida a ele’. Dias depois, veio o comunicado do Comando a considerá-los desvinculados. O Primeiro Ministro apoiou a decisão e o Presidente da Fretilin veio à imprensa afirmar que ‘nem o Presidente da República podia mudar a decisão’, seguido por outras vozes, possivelmente de próprios membros do CCF.

Parecia que era um medir de forças quanto às competências na tomada de decisões, entre os Órgãos de Soberania!

Perguntava a mim mesmo se o motivo que levava as diversas entidades do Estado a pronunciarem-se sobre esta questão das F-FDTL, era genuíno, em termos de ajudar a resolver os problemas! Será que não houve interesses encobertos numa repentina tomada de posição em defesa da instituição militar?

Eu sou do Lorosa’e, eu reorganizei as Forças, eu reorganizei a Resistência! Será que as pessoas só puderam entender o meu esforço de solução dos problemas, como uma tentativa de proteger os peticionários? Só porque mandaram a petição para mim? Será que as pessoas chegaram à conclusão de que os peticionários eram meus protegidos, porque são meus familiares ou porque eles, peticionários, eram as ‘minhas forças’?

Eu sei que o CCF, eleito democratica, legitima e transparentemente no Congresso de Maio de 2006, não podia considerar estas questões, porque seria inaceitável submeter os interesses supremos do Partido a um indivíduo, como o Presidente da República!

Cheguei de Lisboa e fiz uma Mensagem à Nação, tida como aquilo que pôs fogo no rastilho (e da qual mensagem estou pronto para ir depôr perante o Tribunal, assim como mais actos praticados, enquanto Presidente da República)!

Entretanto, tentava-se buscar soluções, criando incentivos aos peticionários. Mesmo assim, até que se implementassem os programas de assistência, chamei a atenção do Primeiro Ministro para o facto de a desvinculação carecer ainda de um processo legal, porque não bastava o Comando declarar essa desvinculação para a imprensa. Nesse sentido, solicitei ao Primeiro Ministro para ver a questão dos salários, a que ainda tinham direito, por não haver base legal para não o merecerem, ao que, o Primeiro Ministro me garantiu que não haveria problemas e que iria agilizar o processo.

À saída do meu gabinete, o Primeiro Ministro declara à imprensa que era um sonho, se os peticionários pensavam que iriam receber os seus salários. Quando li os jornais no dia seguinte, fiquei impressionado com a vontade expressa, a mim, de reduzir as tensões, que entretanto iam aumentando, e a mudança, em minutos, dessa vontade. Perguntado posteriormente, o Senhor Dr. Mari Alkatiri disse-me que reagiu a uma declaração do Gastão Salsinha de que eles não saíram dos quartéis, por causa do dinheiro, mas para obrigar a corrigir alguns erros cometidos na instituição das Forças.

Todo sabiam que haveria manifestação, já que o grupo comunicou, às instâncias competentes, essa intenção.

No primeiro dia da manifestação, logo pela manhã, uma delegação tem uma audiência com o Primeiro Ministro. O Senhor Dr. Antonino Bianco, membro do CCF, faz sair imediatamente um comunicado em que dizia: ‘agora, sim, o Primeiro Ministro já pode resolver o problema, porque é a primeira vez que recebe oficialmente a petição’.

Fiquei surpreendido mas, mais embasbacado, quando muitas horas mais tarde, recebo também a delegação, abro o envelope e leio o conteúdo. Não era uma petição, eram exigências, inaceitáveis, por parte do grupo do Gastão Salsinha. Pensei que, afinal, estávamos apenas a brincar com as competências, de quem pode mais, de quem pode tomar decisões e de quem não.

E eu quero aqui frisar que, para além do CCF e todo o histórico Partido, ninguém acreditou na história fabricada pelo Presidente do Partido e Presidente do Parlamento Nacional, Senhor Lú Olo, de que a delegação dos peticionários entregou uma carta de um Partido dirigida a mim, em lugar de um documento de reivindicação do grupo. O envelope que foi aberto aos chefes de bancada, chamados para testemunhar, não tinha nada escrito. Os doutores da Fretilin no Parlamento esqueceram-se de, pelo menos, escrever ‘Para Sua Excelência, o Presidente do Parlamento Nacional’, como o grupo fez nos envelopes que foram entregues ao Primeiro Ministro, ao Presidente do Tribunal de Recurso e a mim.

Eu não sei se chamarei a isso contra-inteligência ou contra-informação. A certeza é porém uma: de inteligente, há muito pouca relação. Será, no mínimo, necessário um pouco mais de esperteza apenas!

Quando o I Governo Constitucional, eleito democraticamente nas eleições para a Assembleia Constituinte, em Agosto de 2001, anunciou a formação da Comissão dos Notáveis (encabeçada pela membro do CCF, a Dra. Ana Pessoa), o Presidente do Partido, Senhor Lu Olo, resolve fazer passar uma Resolução de apoio, no Parlamento Nacional!

Aí, já deixou automaticamente de existir a questão de interferência nos assuntos internos, institucionais, militares e disciplinares das F-FDTL! Porque a Fretilin decidiu que não havia interferência de nenhuma ordem, porque um membro do CCF iria encabeçar essa Comissão!

O que é que a Comissão vai decidir? Validar a decisão de expulsão? Não vale a pena perder tempo, porque já foram expulsos... desde 1 de Março de 2006.

Averiguar os motivos da petição? E porque não se fez, desde o início, para evitar que tudo desmoronasse, como aconteceu?

Para revelar que, eventualmente, houve alguns erros cometidos nas F-FDTL? Se é isso, onde é que está o respeito que todos devem aos nossos heróis? Então, a Comissão não aprendeu que foi o Presidente da República que provocou isto tudo, por total falta de respeito aos heróis da Libertação da Pátria? Então, a Comissão não se lembra já das afirmações do Presidente do Partido, Senhor Lu Olo, que veio em defesa das Falintil, que foram criadas pela Fretilin?

A Comissão, hoje, não tem medo de ser acusada de desonrar os Aswain? Então, a Comissão já se esqueceu que o Partido declarou que quem ofende as Falintil, ofende a Fretilin, porque foi a Fretilin que criou as Falintil?

Quem pode responder é o membro do CCF que é hoje Presidente da Comissão dos Notáveis! O que eu posso antever é a Comissão dizer que, segundo o Regulamento n.º 2001/12, da UNTAET, a decisão de expulsão foi a mais justa. Se é isto, não é preciso perder tempo! É melhor que o membro do CCF e Presidente da Comissão dos Notáveis, comece já a cuidar do STAE para as próximas eleições

Enfim, ao utilizar o argumento da ‘manifestação dos peticionários’, o CCF inverteu os factos.

Espero que a Comissão dos Notáveis possa revelar, em pormenor, para todo o povo saber, o plano de conspiração e de golpe, que vier a saber das declarações dos militares das F-FDTL.

Já que não posso exigir a entidades históricas que merecem o meu total respeito, em nome do Povo que me elegeu também democraticamente em Abril de 2002, para ser Presidente da República, imploro, rogo, peço ao Comité Central da Fretilin para apresentar com melhores detalhes o plano urdido de golpe e de conspirações, com a identidade de todos os actores, internos e externos.

Só assim o Povo vai ficar descansado, porque a defesa da soberania tem que passar, necessariamente, pelo desmantelamento dessa rede maquiavélica que tem vindo a desrespeitar ‘a ordem constitucional democrática’, promovendo acções de ‘carácter profundamente anti-democrático e golpista’ contra o I Governo constitucional, democraticamente eleito, nas eleições para a Assembleia Constituinte, em 30 de Agosto de 2001.


O último argumento é sobre ‘a crise actual’. Eu peço autorização a todos, para só abordar este assunto, mais adiante, porque diz respeito a todo o documento do CCF.


(Na próxima edição, abordarei outra passagem do documento: ‘Durante estes quatro anos, um plano bem traçado de contra-inteligência foi sendo implementado...’)


Díli, 3 de Novembro de 2006.

O Presidente da República,
Kay Rala Xanana Gusmão

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A teoria das conspirações II

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A teoria das conspirações III
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